A educação da vontade e atividade intelectual

 

A educação da vontade como uma atividade intelectual requer muita disciplina, perseverança e estudo. Há na literatura diversas obras de autores consagrados. Destacam-se obras como A Vida Intelectual do padre e filósofo Antonin-Dalmace Sertillanges (1863–1948), e O Trabalho Intelectual do filósofo Jean Guitton (1901–1999). Estes autores em suas fabulosas obras mostram quão importante é a atividade intelectual para a educação do espírito, sobretudo, o espírito do jovem, mais suscetível às influências do meio. Por exemplo, Jean Guitton recomenda aos jovens regras para uma boa conduta da mente, corpo e espírito. Enquanto que  A. D. Sertillange orienta os jovens na formação moral e espiritual obediente a Deus.

Seguindo estes princípios, o pedagogo francês Jules Payot (1859–1940) descreve em seu livro A Educação da Vontade como a vontade pode e deve ser disciplinada para uma vida calcada na virtude. Nesta obra, publicada em 1895, Jules Payot dá conselhos aos jovens para construir uma vida pautada na retidão do espírito, longe dos vícios e vaidades, direcionada ao trabalho intelectual e do aperfeiçoamento do espírito. Suas orientações vão além das diretrizes para uma vida intelectual plena. Assim como os outros dois autores citados no presente artigo, Jules Payot escreveu em A Educação da Vontade vários capítulos sobre coisas comuns da vida dos jovens como: a higiene, o repouso, o combate a preguiça, o exercício físico e tantos mais. Para Payot a maioria dos jovens cultiva hábitos nocivos a sua saúde física e intelectual. Payot adverte que este comportamento dos jovens, influenciado pelos apelos da vida moderna contribuem para a falência espiritual dos jovens. Payot orienta os jovens a adquirirem hábitos saudáveis, disciplinados, que tenham como resultado a formação de uma pessoa de caráter firme e reto. Desta forma, seus conselhos são uma direção para os jovens.

“A causa de quase todos os nossos fracassos, de quase todos os nossos males, é uma só; a fraqueza da vontade. É o nosso horror do esforço, principalmente do esforço prolongado. Nossa passividade, nossa leviandade, nossa dissipação, são outros tantos nomes para designar esse fundo de Universal preguiça que é para natureza humana o que é o peso para matéria.”  Jules Payot

Disciplinar a vontade pelo trabalho

Payot se refere ao trabalho não apenas como uma simples maneira de providenciar o sustento para a sobrevivência  e sim o trabalho que visa a remuneração do espírito humano e ver na virtude da vontade a porta para o paraíso. Para Payot “a causa de quase todos nossos fracassos, de quase todos os nossos males, é uma só: a fraqueza da vontade”. Portanto, ele aconselha que os jovens não tenham a alma frouxa que, segundo ele, se manifesta em todas as ações da pessoa jovem e convida-os a consagra-se nos estudos para o aprimoramento do espírito e da mente. O jovem deve buscar o trabalho intelectual como forma de moldar cedo a consciência do seu papel no mundo, revelando ainda cedo as suas aptidões nobres do zelo pelo caráter reto. “No fim, se dará à essas ocupações seu verdadeiro nome, ocupações. O nome trabalho será reservado a composição, a eliminação dos detalhes inúteis, a concentração que produz o supremo esforço do pensamento”, escreve Payot.

“Por outro lado, se a vida do trabalhador intelectual não fosse naturalmente fecunda em horas deliciosas, se não fosse uma fonte viva, da qual jorra em abundância as alegrias da vida ativa, ainda assim ela seria o contrário de uma vida ociosa. E pelo simples fato de que o trabalhador escapa às confusões, às  preocupações mesquinhas, ao tédio morno, intolerável dos ociosos, sua existência é dentre todas desejável.”  Jules Payot

“O objetivo do teu trabalhador intelectual deve visar é a energia da atenção voluntária, energia que se traduz não somente pelo vigor, pela frequência dos esforços, mas também e sobretudo por uma orientação muito clara de todos os pensamentos para um fim único e pela subordinação, durante todo o tempo necessário, de seus sentimentos e ideias a grande ideia diretriz, dominadora, para qual trabalho.”  Jules Payot

Pensar é, deveras, o grande problema. Formamos tecnocratas e não pensadores. Esforços mil são direcionados para a formação técnica. É necessário deixar a mente pronta para resolver os problemas do bem-estar material, mas para o espírito a mente não é preparada. As sementes para o florescimento do sentimento ético e moral nos jovens não são curriculares. Todos os métodos educacionais visam esculpir pessoas de valor com base no pragmatismo das urgências modernas. “Como resistir a dispersão do espírito que o ambiente tende a produzir, quando nada na educação prepara nos para essa resistência?”, pergunta Payot, e, prossegue “o que é, aliás, a educação se não o uso de poderosos sentimentos para criar hábito de pensar, de agir, ou seja, para organizar no espírito da criança sistemas coordenados de ideias com ideias, de ideias com sentimentos, de ideias com atos?”.  

A educação na formação do caráter

Para Payot a função da educação auxiliar na construção do caráter nos jovens. Ninguém nasce com caráter. Forma-o ao longo das experiências e a educação é  responsável por introduzir na formação moral do jovem o germe do qual derivará o seu caráter. Dai o caráter pedagógico da obra Educação da Vontade. O caráter, segundo Payot é corolário da educação da vontade, pois assegura, que somente o caráter bem formado e nutrido pelas virtudes conduzirá o jovem aos pensamentos fecundo e o afastará das superficialidades. 

Portanto, os males da sociedade moderna, o principal dele, a sensualidade, é condenado por Payot. A fórmula sensualidade e juventude é  uma fatal combinação para a formação do caráter do jovem. Vejamos que diz Payot: “Não é somente sobre o corpo que há a desastrosa influência da sensualidade, a memória embota-se de forma prodigiosa, o espírito perde toda a flexibilidade, todo vigor. Arrasta-se de maneira lânguida, como que tomado pelo torpor. A atenção é fraca, vacilante. Os dias transcorrem numa indiferença apática, na indolência, numa preguiça desanimadora. Perde-se, sobretudo, essa alegria máscula que é trabalho [intelectual] – este se torna um castigo, quando não tem sua natural recompensa”. Se não somos capazes de domar nosso apetite sexual quão diferente somos dos demais animais?

“Podemos dizer, infelizmente, que o nosso sistema de ensino tende a agravar essa preguiça intelectual fundamental. Os programas de ensino parecem destinados a fazer de todo aluno um disperso. Obrigam esses infelizes adolescentes a adejar sobre todas as coisas e proíbem-os, pela variedade de matérias a absorver, de penetrar com profundidade em qualquer assunto.”  Jules Payot

Um espírito forte e o domínio sobre a vontade

A obra de Jules Payot antes de tudo refere-se a ao domínio da vontade sobre os instintos primitivos,   expõe as nossas fraquezas e nos coloca no caminho do autoconhecimento. O homem é fruto da sua consciência. Ao educar a vontade, estar-se-á expurgando da consciência de si, os  males que jogam a alma nas trevas e subverte a moral esmagando o espírito. Cultivar bons hábitos é essencial para o controle da vontade, ensina Jules Payot. Este é o caminho para a educação da vontade.

“Se a reflexão meditativa tem uma importância tão capital em nosso trabalho de libertação, é urgente entender como se deve meditar, e examinar os recursos materiais, de certa forma, que o conhecimento das leis psicológicas e a experiência podem nos fornecer para esse exercício.”  Jules Payot