A ABOLIÇÃO DO HOMEM

   A Abolição do Homem é considerada a mais importante obra do escritor irlandês C.S Lewis. Nela Lewis se insurgi contra a sociedade que busca reconhecimento através da ciência e da razão e que ver nessas noções o único destino da sociedade. Ele se opõe a uma sociedade unicamente utilitarista e racionalista, onde o conhecimento científico é mais importante que a ética e a moral. Desta maneira Lewis, A Abolição do Homem é uma crítica sobre a natureza tecnicista da Educação Moderna, onde ele retrata a ineficácia do sistema na formação da pessoa moral e ética; em que os alunos são autômatos com o propósito único de atender a uma sociedade do consumo.

   Lewis critica o sistema educacional da sua época na medida em que este é usado para transformar alunos em técnicos especializados e com pouco ou nenhum senso crítico da realidade objetiva. Com efeito, Lewis defende uma educação mais voltada para a moralidade e para a formação do ser humano ético, consciente em sua plenitude. Entretanto, embora Lewis não se coloque como opositor do conhecimento científico, reconhece inclusive a sua importância, ele se posicionou com veemência contra os excessos da educação moderna calcada apenas nos objetivos racionais e utilitaristas.

   Para Lewis, o sistema de educação ideal deve colocar o aluno em contato com a realidade objetiva, dando-lhe a oportunidade de aprimorar o senso crítico sobre si próprio e sobre a sociedade. O jovem deve ter plena consciência da realidade vivenciada e das experiências extraídas do mundo. A educação, observa Lewis, serve como instrumento para criação de indivíduos moral e eticamente inseridos na sociedade como guardiões dos seus valores. 

   É neste sentido que Lewis constrói a narrativa do Livro Verde no qual ele vai refletir sobre a educação como elemento desumanizador no sentido moral e ético. Nessa história, Lewis mostra em diversas passagens que as escolas, longe de formarem seres humanos morais, fazem nascer autômatos cujo único objetivo transcende qualquer ideia de grandiosidade de espírito é valores. A educação deve ter na concepção de Lewis um papel fundamental: que é formar homens e mulheres com a argila da moralidade, mas não uma moral vulgar, mas aquela que nos lança num voo para a solidificação do espírito. 

    Não é para menos que Abolição do Homem comece com uma crítica a qualquer sistema de educação que não busque a emancipação do homem através da ética e da moralidade. Esse tipo de coisa, típico da sociedade moderna, cobrará um preço muito alto, uma vez que uma sociedade sem ética, sem moral não verá nascer grandes espíritos. Nos dizeres de Lewis sobre a educação, “para cada aluno meu que precisa ser protegido contra um leve excesso de sensibilidade, há três que precisam ser despertos do sono da fria vulgaridade. A tarefa do educador moderno não é derrubar florestas, mas irrigar desertos. A defesa certa contra sentimentalismos falaciosos é incutir sentimentos corretos. Quando ajudamos a sensibilidade dos nossos jovens a morrer de inanição, o que fazemos é só torná-los presas mais fáceis do propagandista. Pois a natureza faminta será vingada e um coração duro não é proteção infalível contra a insensatez.”

   Na filosofia chinesa o Tao significa caminho, doutrina, princípio. Em suas reflexões Lewis ressalta “nenhuma emoção é, em si mesma, um juízo; nesse sentido, todas as emoções e sentimentos são alógicas, mas elas podem ser racionais ou irracionais quando se conformam ou deixam de se conformar à razão. O coração nunca toma o lugar da mente; mas ele pode, e deve, obedecê-la”. A Abolição do Homem busca a orientação do indivíduo por um caminho, ou Tao, que representa a sua emancipação como homens e mulheres espirituais num contexto político-filosófico na defesa das verdades universais.

   O caminho que trilhamos, na concepção de Lewis, é a antítese do Tao, o oposto da direção que faz os homens e mulheres pensantes. O homem no seu sentido histórico avança a passos largos nos caminhos da ciência, mas claramente, regride ético e moralmente, afinal o que de grandioso foi realmente criado nos últimos dois séculos no âmbito da moralidade? Nada. Regredimos.

   Em síntese, A Abolição do Homem mostra que hoje, ainda mais que ontem, as reflexões de Lewis têm um significado profético. O homem pleno, formado desde a infância nos valores morais e éticos não se mostra presente nos dias atuais. Estamos tomado por mais técnicas utilitaristas e vivemos sob o domínio da ciência. Somos constantemente ameaçados pelas nossas criações. O criador teme a criatura e dela se torna escravo. Somos seres de carne e ciência, razão e objetivos, mas sem moralidade. A Abolição do Homem nos leva a repensar a visão que temos da realidade e aceitar que cada vez mais nos libertamos da nossa humanidade pela escravidão dos nossos desejos.

 

Reflexões

Ao chegar à idade do pensamento reflexivo, o aluno que foi assim treinado em “afeições ordenadas” ou “sentimentos justos” terá facilidade em descobrir os primeiros princípios da Ética; mas, para o homem corrupto, tais princípios jamais serão visíveis e ele não poderá ter progresso algum nessa ciência. Platão disse o mesmo antes dele.

Os chineses também falam de uma coisa grandiosa (a maior de todas) chamada Tao. Trata-se da realidade que vai além de todas as situações, o abismo que havia antes do próprio Criador. Trata-se da Natureza, do Caminho, da Estrada, da Via. Trata-se do Caminho pelo qual o universo caminha, do qual emergem as coisas de forma eterna, silenciosa e tranquila para o espaço e o tempo. Trata-se também da Via que todo homem deve trilhar, imitando o progresso cósmico e supercósmico, conformando todas as atividades àquele grande exemplar.

Sentimento-Magnanimidade-Peito — esses são os oficiais da relação amorosa entre o homem cerebral e o visceral, pois pelo intelecto ele é simples espírito e por seu apetite, mero animal.

Criamos os homens sem peito e esperamos deles a virtude e a iniciativa. Zombamos da honra e ficamos chocados ao encontrar traidores em nosso meio. Nós os castramos e exigimos dos castrados que sejam frutíferos.

 

C.S. Lewis

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EXPLICANDO O PÓS-MODERNISMO

       O pós-modernismo nasceu após o colapso da URSS e a queda do muro de Berlin, causando fortes influências nas artes, na arquitetura, na literatura e no comportamento das pessoas em geral. Antes ele existia em formato embrionário na escola de Frankfurt. Nos três ramos, artes, arquitetura e literatura ela rompeu com os rigores filosóficos e se colocou em oposição ao modernismo. Tendo como alicerce o niilismo, esquivou-se da tradição filosófica da razão e do sentimento e estabeleceu uma forma de pensar e agir como agente absoluto da realidade. O reflexo deste movimento, tempos depois, criou a cultura da rebeldia em que nos deslocamos de um senso estético do modernismo para uma visão antropofágica do homem como pensamento. Este comportamento reflete na sociedade laivos de ressentimentos e perda de sentido para a vida e para a beleza. Raiva, poder, culpa, luxúria e medo são o produto com origem em Marx, Kierkegaard, Heidegger, Nietzsche e Freud que representam o universo emocional que nos rodeia refletindo diretamente na conduta do politicamente correto. “O pós-modernismo é a primeira afirmação consistente e implacável das consequências de se rejeitar a razão – consequências estas inevitáveis tendo em vista a história da epistemologia desde Kant”, afirma Stephen R. C. Hicks, em sua obra Explicando o Pós-modernismo que conheceremos agora.

  Para Hicks o pós-modernismo abandonou a razão devido a sua incapacidade de compreender a realidade. Se não se consegue aceitá-la, a alternativa é adequá-la a uma visão de mundo completamente contrário à realidade objetiva. Nas palavras de Hicks “a razão é um instrumento dos fracos, que têm medo de se desnudar diante de uma realidade cruel e conflitiva e, por isso, constroem estruturas intelectuais fantasiosas para se ocultar.” O iluminismo no século XVIII nasce insurgindo-se contra a Igreja e colocando o homem no centro das coisas, nasce a favor da razão e contra a superstição, suas principais agendas. Em contrapartida, o pós-modernismo se opõe a toda a forma de pensamento ocidental. O resultado é a alimentação da crença que tudo pode e deve ser desconstruindo para então dá lugar ao vazio existencial. Hicks observa que “a defesa da razão e do individualismo ameaçava os primeiros pensadores do contra iluminismo com o espectro de um futuro sem Deus, sem espírito, sem paixão, sem moral”. Neste sentido, o livro Explicando o Pós-modernismo examina três fases anteriores ao pós-modernismo e seus representantes para mostrar como o ceticismo do pensamento socialista da nova esquerda desconstrói, desde Rousseau a Foucault, os fundamentos da doutrina socialista e ergue em seu lugar uma nova filosofia socialista. 

        No espectro político, o pós-modernismo é definido, segundo o Hicks, como “uma estratégia ativista contra a coalizão da razão e do poder”, pois o seu propósito é desconstruir o pensamento iluminista que se sustenta sobre três pilares: a razão, a verdade e a correspondência entre a pensamento e realidade. O pensamento político pós-modernista, é embasado por uma nova dinâmica remodelada no pensamento da vanguarda intelectual aqui representada pelos filósofos da desconstrução Michael Foucault, Jacques Derrida, Jean-François Lyotard e Richard Rorty em que o poder deve migrar da minoria dominante para os oprimidos. Hicks vê uma clara causa dos motivos que levaram ao crescimento do pós-modernismo. Para ele, “o Pós-modernismo surgiu como uma força social entre os intelectuais porque o contra-iluminismo derrotou o Iluminismo nas ciências humanas”. Sem espaço para suas reflexões filosóficas, uma vez que a ciência – nas palavras de Hicks – exigia uma visão mais racional da realidade, os novos filósofos se ressentem e procuram uma maneira de mostrar que está tudo errado. 

         É preciso frear o pensamento racional e a melhor forma de fazê-lo é através da destruição total dos valores ocidentais que têm profundas raízes nas tradições judaico-cristãos e no patriarcado romano. Sob a visão do pós-modernismo há uma palavra de lei que para o Hicks faz com que os intelectuais se engajem no ativismo político no lugar do estético: o desconstrutivismo. Este pressupõe uma ausência de sentimento de culpa conforme cita o autor as palavras do filósofo pós-moderno Stanley Fish: “A desconstrução me libera da obrigação de ser correto… exige apenas que eu seja interessante”. Eis aqui o lema da filosofia esquerdista. Ou seja, ao desmontar uma verdade inventada, não sou responsabilizado pelas suas consequências desde que exista nisso um senso de rebeldia contra sistemas estabelecidos e uma intenção clara de desfazer por desfazer o que está pronto e solidificado. “A razão iluminista conduz a descrença; a descrença conduz a desobediência; a desobediência conduz à anarquia “, afirma Hicks.

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ESQUERDA CRISE E FUTURO

   No livro “Esquerda – crise e futuro”, de autoria do professor e escritor José Maurício Domingos revisita a trajetória do governo petista identificando suas falhas e propondo reflexões para uma reconstrução do pensamento de esquerda e a própria recuperação do Partido dos Trabalhadores (PT), enquanto uma agremiação da causa operária.

   O autor observa que uma profunda crise no país e, sobretudo na esquerda, causaram profundas fissuras na esquerda e esgarçam o tecido social. Segundo o autor, o Partido dos Trabalhadores (PT) auxiliou na quebra de confiança e saturação que repercutiu diretamente na história e na práxis da esquerda no Brasil. Assim, Esquerda – crise e futuro, retrata o erro do PT que se perdeu no mar de corrupção e erros graves na condução do país nos anos em que governou o país.

   Ao ler o livro, não há como não relembrar o comentário do cantor de rap Mano Brown que num evento do PT em que se encontravam várias personalidades do mundo artístico e político quando ele protestou para todos os presentes contra o PT ao, segundo ele, afastou do verdadeiro interesse do povo. É sobre esta questão que o livro Esquerda – crise e futuro vem discutir e buscar alternativa para salvar o PT. Ao final esta obra propõe “a retomada dos caminhos da vanguarda da esquerda que ao longo dos séculos XIX e XX revirou o mundo de ponta a cabeça e fez história. É um alerta para evitar que a esquerda perca a tradição ao não mais se identificar com as suas raízes.

   É fato que, para o PT, o afastamento das ideologias que lhes deram formação e credibilidade abriu espaço para a ascensão da direita. A vitória de Jair Bolsonaro à presidência da república nas eleições de 2018, representou não só uma derrota profunda no espírito esquerdista, assim como fortaleceu a direita por causa da corrupção envolvendo o PT e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. É claro, e nunca é demais lembrar, que a vitória do presidente Jair Bolsonaro representou antes de tudo uma amostra do quanto o povo estava insatisfeito com o governo petista, senão como explicar o fenômeno Bolsonaro que venceu o pleito com pouco tempo nas mídias, sem dinheiro, enquanto o PT tinha o poder e dinheiro da máquina estatal ao seu dispor.

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BUROCRACIA

       O socialismo como sistema de governo prima pelo gigantismo do Estado. Para os socialistas o Estado deve ser uma engrenagem gigantesca, não necessariamente eficiente, altamente interventor e planificado em todas as áreas em que atua. A sua espinha dorsal é a burocracia. Todo o grande Estado precisa de excessivo processos operacionais, um imenso volume de pessoas para fazer a mesma operação de um e, papel e carimbos. Toneladas de documentos, milhares de departamentos, setores, divisões, seções, unidades e sabe mais o quê. Tudo isso tem um nome: burocracia. 

        Com efeito, todos os cidadãos e cidadãs têm verdadeiro horror à burocracia porque simplesmente foi, é ou será sua vítima. Infelizmente a burocracia ao atingir diretamente o cidadão fere de morte toda a sociedade, pois o que se vê é a nação se arrastar sob o peso da obesidade do governo levando ao atraso em todos os seguimentos da sociedade e custos altíssimos para manter a máquina estatal funcionando. A burocracia causa um imenso atraso no desenvolvimento econômico e social em qualquer lugar que ela se instale. Entrementes, é notório que a burocracia quando usada com fins políticos o estrago que ela causa a sociedade é algo incalculável, pois o seu uso passa a ser o de aparelhamento político do Estado. Regimes totalitários como o de Stalin mantinha o gigantismo do Estado a fim de manter a população e toda a estrutura da sociedade sob o seu total controle. Neste contexto, os pensadores da liberdade tais como os integrantes da Escola Austríaca de Economia acreditavam que a burocracia, mais que um inchaço no corpo do Estado, era um instrumento de poder.

       Destarte, o economista austríaco Ludwig von Mises (1886-1973) foi um dos maiores críticos da burocracia. Em 1944, década da grande Segunda Guerra Mundial, com efeito, período do império da burocracia, sobretudo na Europa, Mises escreveu um pequeno tratado intitulado Burocracia. Nesta obra, Mises vai ao cerne da questão e expõe as falhas dos sistemas burocráticos; compara a eficiência o setor privado no tocante a produção e gestão de bens em relação aos resultados sofríveis do setor público, sobretudo quando o assunto é política econômica; dar evidências de que os resultados do planejamento central estatal, longe de resolver os problemas da sociedade é o seu maior causador; crítica a não compreensão do cálculo econômico por parte do poder público; derruba as falácias esquerdista que sustentam que o sistema de governo socialistas  traz mais resultado positivo para o bem-estar geral das pessoas que os sistemas capitalistas e sua ânsia por lucros. Portanto, ao escrever Burocracia Mises propõe uma reflexão sobre o quanto pesa no bolso e na vida do indivíduo viver sob regimes burocratas.

        Mises argumenta que há um total desconhecimento do que significa realmente o termo “burocracia”. Para a maioria é qualquer tarefa cujo fluxo é feito de forma mais longa e envolvendo muitas pessoas quando poderia ser menor e com menos pessoas. Mises entende que se quisermos entender o que o termo burocracia significa, precisamos entender o próprio termo, dissecando o, principalmente, compreendendo qual a relação que ele tem com os fins lucrativos no esquema de uma sociedade socialista. Mises argumenta que para conhecermos os méritos e deméritos da burocracia basta colocar as suas operações com fins lucrativos na sociedade capitalista. Logo se verá que os lucros são reduzidos ou até mesmo inexistentes quando visto da ótica do lucro. Mises aponta, deste modo, que “gestão burocrática é o método aplicado na condução de questões administrativas e cujo resultado não tem qualquer valor monetário no mercado“. Por isso ele afirma que a burocracia não é mais que uma consequência de coisas e mudanças mais profundas e que não basta reduzir os processos e pessoas para então achar que o problema foi resolvido. O inchaço das instituições públicas com a criação de novos departamentos e agências associada à intervenção desenfreada do Estado na coisa particular com um nível hierárquico de pessoas e funções impensável no setor privado é que contém os germe dos excessos da burocracia. Por isso que Mises adverte:

Os críticos da burocracia caem no erro de atacar apenas um sintoma e não coração do mal

Donde Mises conclui:

Temos aí o resultado do novo sistema de governo que tanto mais restringe a liberdade individual quanto mais tarefas vai te levando ao governo. O culpado não é o burocrata é o sistema político.

Sendo que:

A tendência à rigidez burocrática não é algo inerente à evolução dos negócios, é um resultado das políticas construídas para roubar a motivação do lucro, o papel que lhe cabe no esquema da organização econômica da sociedade.

 Portanto:

Nossa tarefa é, por meio da investigação intelectual, descobrir quais são as características peculiares da gestão burocrática enquanto distinta da gestão comercial, pois não se pode medir os objetivos da administração pública em termos de dinheiro e nem avaliar o estado atual por meio de métodos contábeis. 

        Quanto menos burocracia melhor, temos observado e vivenciado ao longo das décadas após a publicação desta obra de Mises. Mas não caiamos no equívoco de achar que Mises é contra a burocracia.  Não é. Ele foi um burocrata nato, pois trabalhou para o Estado a maior parte da sua vida. O que ele faz nesta obra é nos convida para a reflexão sobre os excesso da burocracia como elemento complicador, em diversas áreas da gestão pública, da fluência das coisas públicas, sobretudo aquela direcionada para pensar e resolver os problemas econômicos, esta última, ideia que Mises se opõe.

       Esperar que um dia os serviços públicos tenham a mesma eficiência encontrada nos setores privados é também um erro, dado que como Mises expõe nesta obra, a burocracia é um mal necessário inerente à condição de governo estatal. Entretanto, devemos cobrar das pessoas governantes mais eficiência no uso dos recursos públicos e meios para melhor prestar serviços à população sem que torne vida dela um martírio com tantos impostos e regulamentação, controles etc.

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A MODERNIDADE NUM JULGAMENTO SEM FIM

      Certa feita estava assistindo um vídeo do professor Olavo de Carvalho em que ele desenvolvia algumas reflexões sobre o marxismo quando ele falou de um autor e sua obra como sendo um dos mais completos estudos sobre o marxismo. Tratava-se de Leszek Kolakowski e a sua obra “As principais Correntes Marxistas”.  Tempos depois fiquei conhecendo um outro trabalho desse grande escritor e profundo conhecedor do seu tempo. O livro A MODERNIDADE NUM JULGAMENTO SEM FIM, do Kolakowski, é um mergulho na visão de um homem que viveu as agruras da vida como coadjuvante na história do século XX. Ele não via o mundo se esfacelando através da janela à frente da sua escrivaninha.  Ele estava lá, onde a carne era dilacerada, onde a dor é a humilhação são as companhias de quem perdeu total e inexoravelmente a consciência de si e da realidade. Assim como Alexander Soljenítsin, autor da famosa obra reveladora sobre os campos de concentração Gulag, Kolakowski experimentou na pele e na alma o quão longe pode chegar a bestialidade no homem. Quando o mal vem revestido do verniz das boas intenções, quando os fins justificam os meios, somente homens são o laboratório para as mentes doentias. Este homem, culto, marcado pelo seu tempo, expõe nesta obra as suas chagas relendo os aspectos da vida que transbordam em sangue e lágrimas as angústias do mundo em decomposição. Um mundo que se encontra em um julgamento sem fim.

       Quando Kolakowski escreveu “A Modernidade num Julgamento sem fim” o mundo já curvava-se ao autoritarismo das ideias pós-modernas. Na época Kolakowski perguntava-se o que virá depois do pós-modernismo. A resposta é: as raízes do mal só podem brotar o mal pois “pelos frutos vos conhecereis”. Dos magos do pós-modernismo Marcuse, Oppenheimer, Adorno e Benjamin, fundadores da Escola de Frankfurt e de suas perniciosas doutrinas filosóficas, o que podia ficar pior… ficou. O que são as famigeradas Teorias Críticas senão corolário das teorias da Escola de Frankfurt? Livros como “Guerra Cultural” e “Explicando o Pós-modernismo” de Stephen Hicks ou “Teorias Cínicas” de Pluckrose e Lindsay revelam o mal que é o pós-modernismo na prática, no que tem se transformado a sociedade atual. A irracionalidade dos seus idealistas demonstram a total incapacidade de eles se relacionarem com a realidade objetiva num exemplo tácito daquilo que se chama dissonância cognitiva.  Eis o grande mal da Escola de Frankfurt: idealizadas por mentes pervertidas para subvertendo a sociedade e submeterem as pessoas às experiências de engenharia social. 

       O pós-moderno é uma ideia de se é possível viver bem num mundo caótico simplesmente subvertendo valores e a ordem. Isso naturalmente é uma falácia.  Kolakowski se pergunta: Eu não sei o que é pós-moderno e como este difere do pré-moderno, nem sinto que eu deveria saber”. Na verdade, somente os loucos de Frankfurt e os seus seguidores com as suas teorias críticas acham que tudo aquilo que deu origem à civilização ocidental tem que desaparecer para dar lugar ao inverossímil. O que eles postularam foi o fim da civilização paraquedas no lugar fosse erguida as bases para uma civilização, não de pessoas, mas de fantoches. “E o que poderá vir depois do pós-moderno? O pós-moderno, o neo-pós-moderno, o neo-antimoderno?”, continuando Kolakowski infere: “Quando nós deixamos de lado os rótulos, a verdadeira questão permanece: por que o mal-estar associado à experiência da modernidade é sentido de maneira tão ampla, e quais são as fontes desses aspectos da modernidade que fazem desse mal-estar algo particularmente doloroso?”. Sim, caríssimo Kolakowski você não imagina a dor que esses pensamentos da esquerda selvagem tem causado a todos nós, pelo menos àquelas pessoas que são movidas pelo sentimento de verdade e justiça. A curto e médio prazo, numa visão mais otimista, é que não haverá recrudescência pois o que vemos é um avanço cada vez maior dessas ideias incrustadas nos jovens completamente ideologizados pelas teorias críticas.

         Na minha opinião, o livro A MODERNIDADE NUM JULGAMENTO SEM FIM já é um clássico, e se ainda não for um clássico, certamente o será pois o nome de Kolakowski já se encontra entre os gigantes do pensamento político. A compreensão da sua visão política do mundo é fundamental para uma boa reflexão sobre os tempos de hoje. Assim como Raymond Aron, ele escreveu como poucos sobre tempos difíceis, o seu tempo. Como Raymond Aron, ele deixa lacunas, ausência de resposta às perguntas que nos afligem sobre os tempos modernos. Mas, assim como Raymond Aron se não há respostas para os nossos anseios, ele nos coloca, por outro lado, em direção às reflexões que podem um dia nos fazer compreender o julgamento da modernidade. Eis algumas condensações das ideias de Kolakowski:

A crítica da modernidade, seja literária seja filosófica, pode ser vista, em sua imensa variedade, como um órgão de autodefesa da nossa civilização, mas até agora não conseguiu impedir que a modernidade avançasse em uma velocidade sem precedentes.

A questão é que no sentido normal de racionalidade não há mais bases racionais para respeitar a vida humana e os direitos do indivíduo do que digamos, para proibir o consumo de camarão entre os judeus, de carne na sexta-feira entre os cristãos e de vinho entre os muçulmanos. Esses são todos tabus “irracionais”. E um sistema totalitário, que trata as pessoas como partes intercambiáveis na máquina estatal, a serem usadas, descartadas ou destruídas de acordo com as necessidades do Estado, é, em certo sentido, um triunfo da racionalidade. Ainda assim, para sobreviver, ele é obrigado a restaurar relutantemente alguns daqueles valores irracionais e, portanto, negar sua racionalidade, provando desse modo que a racionalidade perfeita é uma meta autodestrutiva.

Estamos todos bem cientes de que poderosas forças culturais estão mesmo nos empurrando em direção à unidade, uma unidade bárbara construída sobre a perda e o esquecimento da tradição.

Outra força desse tipo, proveniente da Europa, é o espírito da tecnologia. Nascido dos sucessos extraordinários da ciênciaincluindo sua luta contra a miséria, a doença e o sofrimento – e acertadamente orgulhoso de suas realizações espetaculares, levou-nos a duvidar do valor e da validade de qualquer tradição que não venha a contribuir para o progresso da ciência e da tecnologia. A redução gradual do lugar e da importância atribuídos às línguas clássicas e às disciplinas históricas como são ensinadas no Ensino Médio em todo o mundo testemunha sua influência destrutiva.

O iluminismo surge de uma herança cristã reconsiderada; a fim de se enraizar, ele deve derrotar as formas cristalizadas e ossificadas dessa herança. Quando de fato começa a se enraizar, em uma forma ideológica humanista ou reacionária, isto é, sob os contornos de Reforma, ele gradualmente se afasta de suas origens para se tornar não cristão ou anticristão. Em sua forma final, o iluminismo se volta contra si, o humanismo se torna um niilismo moral, a dúvida leva ao niilismo epistemológico, e a afirmação do indivíduo passa por uma metamorfose que o transforma em uma ideia totalitária. A remoção das barreiras erguidas pelo cristianismo para se proteger contra o iluminismo, que foi o fruto de seu desenvolvimento, trouxe o colapso das barreiras que protegiam o Iluminismo da sua própria degeneração, seja em direção a uma deificação do homem e da natureza, seja rumo ao desespero.

Ao falarmos de intelectuais como uma classe, não pensamos em todos aqueles profissão relacionada com a palavra, mas naqueles que têm um trabalho em que a palavra se torna, por assim dizer, criativa (tanto quanto destrutiva); desse modo, nós não consideramos aqueles que simplesmente transmitem a palavra com mediadores, mas aqueles que a usam para impor uma percepção específica de mundo a outros, de modo a criar assim um novo mundo.

O intelectual, por outro lado, não é um pesquisador ou descobridor, em um sentido estrito, ele estabelece reivindicações que vão além disso, usa a palavra para sugerir a própria interpretação do mundo, ele não deseja simplesmente transmitir a verdade, mas criá-la. Ele não é um guardião da palavra, e sim um fabricante da palavra.

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O CRISTÃO E A POLÍTICA

       Nikolas Ferreira  é mesmo um garoto prodígio. O rapaz surgiu imponente antes da vitória de Bolsonaro à eleição de 2018 para presidente do Brasil e logo se destacou nas redes sociais pelas suas defesas obstinadas aos valores cristãos e da família tornando-se uma grande e jovem promessa do conservadorismo no Brasil. Admirador do Professor Olavo de Carvalho e por este influenciado pois teve oportunidades de aprender com o professor, chegando inclusive e entrevistá-lo em sua residência nos Estados Unidos, Nikolas Ferreira tem fortes senso crítico sobre o esquerdismo. É exatamente isso que se vê  em seu primeiro livro O Cristão e a Política, uma pequena obra que se mostra grande e revela quão valoroso é o seu autor. 

       Ainda sobre Nikolas Ferreira, suas críticas contra a esquerda e a tudo quanto ela representa logo o tornaram conhecido na Internet e com isso colecionou muitos desafetos de políticos e de muita gente poderosa. Destemido, expunha com uma impressionante franqueza as suas opiniões sobre os rumos que a política tomava sob a ameaça do retorno de Lula ao governo do país (o que infelizmente aconteceu). Sem medo das retaliações como era de se esperar de um autêntico cristão sempre se posicionou contra a ideologia de gênero e todas as pautas esquerdistas. Jamais negou de que lado da história ele se encontra, como diria Ben Shapiro. Graças ao seu posicionamento como cristão foi um dos deputados mais bem votados nas eleições para presidente em 2022, cuja vitória, para a sua decepção e a de mais de 50 milhões de brasileiros que votaram no então presidente Bolsonaro, com Lula que voltava a presidir o Brasil. No entanto, o Nicolas  que ficou conhecido como a mais jovem força conservadora na Internet não decepcionou os seus eleitores. Agora deputado, Nikolas Ferreira demonstra que se não tinha medo de ninguém antes não será agora que ele vai recuar e decepcionar aqueles que nele acreditaram. Sua defesa do conservadorismo e as suas críticas a esquerda e, principalmente, ao atual governo e muitos parlamentares petistas e “esquerdopatas” de plantão ganharam mais força e Nikolas Ferreira tem sido uma poderosa voz conservadora na Câmara dos Deputados.

      Aquela mesma atitude que o tornou notório, vemos em seu livro O Cristão e a Política.  Neste seu primeiro trabalho como escritor Nikolas Ferreira demonstra o precoce conhecimentos que ele tem das origens das ideias políticas da esquerda e de suas consequências. Isso fica claro nos capítulos em que ele sintetiza os estragos que causaram à sociedade pensadores como Karl Marx, Antonio Gramsci, os expoentes da Escola de Frankfurt e Paulo Freire com todas as nefastas consequências como o pós-modernismo. Ele mostra que existem cinco armas de influência política: ativismo LGBT, ideologia de gênero, universidades, feminismo e cultura. Todos instrumentos de manipulação das massas e frutos das ideologias das esquerdas. Como não poderia deixar de ser, Nikolas Ferreira  reserva alguns capítulos para criticar a ideologia de gênero, a militância LGBT demonstrando conhecimento de causas quando revela as origens desses movimentos e os seus criadores. 

        Observador determinado, Nikolas Ferreira chama a atenção para os riscos que as Igrejas cristãs correm ao permitir que os jovens desvirtuem-se da Verdade cristã. Os católicos progressistas, há muito corroem as bases doutrinárias do cristianismo ao fazer uma releitura dos ensinamentos de Cristo adequando aos “tempos”, afirmando que é a única maneira plausível para conquistar os jovens e mantê-los firmes na “fé cristã “. Segundo eles, é necessário que os cristãos se adaptem ao pós-modernismo sob o risco de desaparecerem. Porém, a realidade é que os jovens, tabula rasas por natureza, estão corrompidos por “ideais progressistas” que nenhuma relação tem com os dogmas do verdadeiro cristianismo. Outrossim, líderes carismáticos de espírito progressista, fruto da Teologia da Libertação e do liberalismo cristão, encontram nos jovens os meios apropriados para plantarem suas ideias esquerdistas. O resultado está estampado no crescimento de cultos de caráter libertários. Daí os encontros de jovens, que no lugar de discutir os caminhos verdadeiros para o fortalecimento e difusão das tradições cristãs, não passam de encontros de deturpação espiritual. Ou seja,  no lugar de elevação espiritual na palavra do Deus Altíssimo os jovens estão acreditando que servem aos mesmos propósitos das tradições cristãs quando misturam hábitos e comportamentos seculares com a Sagrada Escritura. Como consequência dessa doutrinação política cresce cada vez mais o número de jovens que se colocam a favor do abortismo, da ideologia de gênero, contribuindo desta maneira para o fim da tradição cristã em detrimento a uma “nova forma de expressar a fé “. 

       Nikolas Ferreira aponta que a guerra cultural fará vítimas. Quem seriam as maiores vítimas senão os jovens? O aborto é uma exemplo tácito de que a esquerda comete graves erros quando tenta mudar o curso natural das coisas. Veja que a esquerda sempre foi a favor da liberdade sexual e militava em torno do sexo livre.  Pois bem, sexo praticado de forma desmedida e sem métodos contraceptivos adequados, sobretudo por jovem (as suas maiores vítimas), causa a gravidez indesejada. A solução encontrada pela esquerda foi disseminar o uso do contraceptivo, mas vê-se que isso não deu muito certo entre os jovens, pois é da natureza do jovem transgredir as regras. Não conseguindo sucesso esperado pela turma do sexo livre a esquerda entende que o melhor é assassinar o feto. Logo se ver que o aborto não passa de uma pauta ideológica e não de caso de saúde pública como pregam muitos ativistas, pelo contrário, gerar filhos não é doença.

         Quem é conservador, mas acima de tudo quer um Brasil verdadeiramente livre é democrático não deve deixar de ler o livro de Nicolas. Neste livro Nikolas Ferreira sintetiza a voz de milhões de pessoas que sonham com um Brasil livre das garras do autoritarismo de toga e da corrupção institucionalizada. Por tudo isso, pela juventude, pela determinação e por consagrar a sua vida em defesa da pátria, dos valores cristãs e da família é que Nikolas Ferreira nos faz acreditar que ainda há esperança quando olhamos para o Brasil do amanhã. Nikolas Ferreira é a evidência de que nem todos os jovens são ideologizados e que não são boias derivando ao sabor das agendas esquerdistas. Enquanto muitos jovens estão perdidos e com suas mentes incapazes de compreender a realidade que mostram que são massa de manobra, Nikolas Ferreira com argumentos sólidos destrói as narrativas daqueles que se dizem defensores da democracia. Reside nele a esperança dos nossos jovens e que ele possa ser uma semente que dará muitos frutos.  Oramos a Deus para que ele não se curve ao mal e que use bem a inteligência e força que Deus lhe deu. Em suas palavras Nikolas Ferreira sintetiza que devemos descruzar os braços em duas expressões:

Tenho um objetivo principal com este livro: fazer com que você compreenda que nós, cristãos, estamos em maioria no Brasil; por isso, precisamos estar preparados para responder àqueles que questionam a razão da nossa fé (1 Pedro 3.15). Se tivéssemos convicções sólidas sobre o fundamento da nossa esperança, não haveria tantas pessoas capazes de influenciar uma geração inteira para o mal. O Brasil não precisa de mais cristãos, mas sim de mais pessoas que vivam o cristianismo.

Se o mundo tem aplaudido você, fique atento. Há boas chances de a mão de Deus estar imóvel.

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A KGB E A DESINFORMAÇÃO SOVIÉTICA

        Com o fim da União Soviética e não menos antes dela, muitos agentes secretos desertores que serviram a KGB, polícia secreta da antiga União Soviética stalinista, tornaram públicos a complexa estrutura da KGB e como ela criou a maior rede de espionagem que já existiu. Entre os ex-agentes da KGB, Ladislav Bittman ficou conhecido por suas informações e análises sobre as OAs em seu livro A KGB e a Desinformação Soviética, que revela como ele desertou do serviço de segurança e inteligência tcheco, em 1968, bem como funciona toda a engrenagem da espionagem e desinformação. Com base na sua experiência e compreensão do funcionamento das OAs, Bittman explica como Moscou trabalhou para através da desinformação destruir a reputação dos EUA e de todos os que se colocassem a favor deste e contra o Kremlin. Bittman conta em seu livro que, “passei quatorze anos na inteligência comunista, incluindo dois anos como comandante-adjunto do departamento tchecoslovaco de desinformação”, tempo suficiente para ele conhecer com profundidade todas as estratégias soviéticas de espionagem. Sobre as OAs Bittman esclarece que, “em 1959, a União Soviética estabeleceu, dentro da KGB (o Comitê de Segurança do Estado), uma unidade especial denominada Departamento de OAs, especializado na elaboração de propaganda negra [black propaganda] e desinformação”.

        Embora Hollywood tenha se esforçado para mostrar ao mundo o poder e organização da CIA, uma espécie de polícia secreta norte-americana, o que se depreende das revelações de Bittman é que a KGB sempre foi superior à CIA, logrando êxito mesmo quando a estratégia parecia débil. Os soviéticos mantinham uma rede de espionagem a custos de milhões de dólares por todo o mundo. Seus tentáculos se encontravam em todas as instituições em países europeus e, sobretudo, nos Estados Unidos, onde praticamente não havia repartições públicas que não tivessem um espião russo, seja inserido através de algum programa de colaboração mútua forjado pela URSS fingindo um objetivo nobre, ou através de recrutamento de pessoas, geralmente com cargos públicos, funcionários de empresas privadas insatisfeito, professores e intelectuais ou qualquer pessoa que através dela possa se obter informações sigilosas do governo para após treinamento incutir mentiras e destruir reputações.

     Bittman observa que, “o aparato soviético de propaganda e desinformação é, sem sombra de dúvida, o maior e o mais eficiente em todo o mundo”. De fato, no auge da Guerra Fria a URSS chegou a ter mais de 2 milhões de agentes trabalhando em todo o mundo. A URSS gastava milhões de dólares com as operações e financiamento de guerras e dissidências entre a estrutura organizacional de governos para destruí-los ou para tê-los como bodes expiatórios. Bittman revela  como a KGB recrutava novos membros para as operações, os mais interessantes eram os simpatizantes pelo stalinismo. “Tanto a KGB como os países-satélites soviéticos recrutavam indivíduos de todas as camadas políticas e sociais, incluindo empresários americanos, cientistas, burocratas de Washington e até mesmo agentes da CIA”. Com a criação das OAs as operações podiam facilmente ser descentralizadas sem a perda de controle do Kremlin e assim os soviéticos podiam destruir principalmente os EUA, seu maior inimigo.

      Munido de um eficiente sistema de espionagem e um dos mais complexos e poderosos sistemas de desinformação já até então conhecidos, a URSS foi capaz de acabar com carreiras, destruir presidentes, demolir países e matar muita gente. “Com o auxílio das nações-satélites, a KGB iniciou centenas de operações que visavam criar confusão e roer o prestígio dos Estados Unidos e de outros países da OTAN através de práticas como a forja de documentos, infiltração de agentes de influência e da manipulação das mídias de massa”. Bittman explica que, na verdade, enganar não é difícil quando o oponente cria todas as condições para que seja movido todo o aparato necessário para obter o que se quer. “A enganação é um jogo relativamente fácil, particularmente contra quem quer ser enganado”, adverte.

     O processo é lento mas o resultado é garantido conforme observa Bittman “eles crêem que a produção em massa de desinformação e propaganda, ao longo de muitos decênios, surtirá um efeito significativo. Essa estratégia, ao que tudo indica, funciona”, e investem em intensa preparação dos seus agentes e dos cérebros que a partir do enorme volume de informações sigilosas recebidas de todo o mundo compilam estratégia para espalhar a desinformação. Os soviéticos conduzem dois tipos básicos de atividade de inteligência. O primeiro, classificado como uma função “passiva” ou de compilação de informações, foca-se na reunião duma ampla quantidade de informações secretas sobre as forças e as fraquezas dum determinado adversário, além dos seus planos e intenções. O segundo tipo abrange operações secretas especiais, chamadas no linguajar comunista de OAs. Essas operações são um elemento vital da política externa soviética”, esclarece Bittman. 

        De todas as instituições utilizadas pela KGB para alcançar os seus objetivos, a mais visada é a imprensa.  Inserir um agente, altamente qualificado em jornalismo, nos principais jornais do oponente tem uma força fora do comum, capaz de lançar uma mentira que em poucas horas podem destruir reputações, mudar o destino de uma nação, causar uma guerra, ou obter apoio incondicional e manipular a opinião das massas. Bittman explica que, “no sistema democrático americano, a imprensa desempenha um papel importante, não apenas como um canal de comunicação, mas também como uma força política ativa. Portanto, ela é um alvo frequente de várias campanhas de propaganda internacionais e de ardis desinformativos que visam influenciar e enganar jornalistas profissionais e, em última análise, o público americano”, portanto, a imprensa passa a ser, no jogo político da desinformação, uma peça fundamental e altamente estratégica.

       Erra quem pensa que ler hoje em dia sobre as estratégias das polícias secretas do tipo KGB é perda de tempo, pois já anacrônico.  Ledo engano, pobres incautos. Na verdade a Rússia de hoje continua com o mesmo poderio de espionagem e desinformação que na época de Stalin. Vejamos: quem é  o presidente da Rússia atualmente? Vladimir Putin. Bingo. Quem conhece a história de Putin como ex-membro da KGB, de onde ele alcançou importante posto na linha de comando, pode desconfiar do fim da KGB. Primeiro a KGB não acabou, transmutou-se e agora existe com o indisfarçável nome de FSB (Serviço de Segurança Federal da Federação Russa), muda-se o nome mas não os métodos. A FSB agora está sob o comando absoluto de Putin e ao seu serviço.

       Não dá para acreditar em nada que é noticiado pela imprensa internacional a respeito do governo de Putin. Só torna-se conhecido aquilo que é relevante para Putin que assim o seja. Os incautos, com ares de autoridade, supõem que sabem o que se passa na cabeça de Putin. Assim como Stalin enganou a todos bem embaixo dos seus narizes, Putin o faz também, porém bem mais equipado com a alta tecnologia da informação. Vale ressaltar que Stalin precisava, na época, contrabandear conhecimento tecnológico, a Rússia de Putin produz tecnologia própria e de altíssima qualidade. A cortina de ferro agora é de titânio com a paisagem do paraíso pintada para o lado do inimigo. Quem viver verá!

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DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DO HOMEM E DO CIDADÃO

      Basicamente, a obra de Georg Jellinek, A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, busca responder, através de uma análise minuciosa do autor a seguinte questão: afinal, qual é a fonte inspiradora da Declaração dos direitos dos homens homens do cidadão, na França de 1789? Alguns estudiosos, como observa Jellinek, defendem que a origem das ideias de direitos do homem se encontra no Contrato Social de Rousseau. Os franceses se encontram entre a maioria que acredita que o Contrato Social de Rousseau deu origem às ideia de direitos do homem contidas na Declaração francesa dos direitos do homem e do cidadão e que a Declaração de independência dos Estados Unidos da América de 1776 serviu de modelo. Porém, há uma outra corrente de pensadores que acredita que a origem da carta magna aqui aludida não provém do Contrato rousseauniano.

      Georg Jellinek se encontra entre estes últimos e vai além: para Jellinek a verdadeira fonte das ideias sobre Direitos do Homem encontrada na Declaração vem da Bills of Rights (Declaração de Direitos), ou seja, das colônias da Virgínia saíram as ideias que permearam a Declaração francesa. Expressa-se Jellinek neste tema da seguinte forma: “A Declaração de 26 de agosto de 1789 se colocou em contradição com o Contrato Social. É verdade que a obra de Rousseau exerceu, sobre algumas fórmulas dessa Declaração, certa influência de estilo, mas a ideia mesma da Declaração proveio necessariamente de outra fonte”. Isso porque Jellinek entende que, “a Declaração de Direitos pretende traçar entre o Estado e os indivíduos a linha demarcatória eterna que o legislador deve ter sempre diante de seus olhos, como o limite que, de uma vez por todas, lhe é imposto pelos direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem. Os princípios do Contrato Social são, por conseguinte, absolutamente contrários a toda declaração de direitos, pois deles resultam não o direito do indivíduo, mas a integralidade do poder da vontade geral, que, juridicamente, não tem limites”. Portanto, para Jellinek “a concepção de um direito originário que o homem transportaria na sociedade, e que se apresentaria como uma limitação jurídica do soberano, é expressamente rejeitada por Rousseau. Não há uma lei fundamental que possa atar a comunidade, nem mesmo o contrato social”.

        Não tendo os seus fundamentos extraídos do Contrato Social, resta saber se esses fundamentos vieram do Bills of Rights da Virgínia ou do Direito Inglês.  Jellinek vai mostrar que pelas características do Direito Inglês não seria possível que a Declaração francesa tivesse se inspirado totalmente em sua carta. Mas também ele esclarece que a Declaração francesa não se inspiraria no Bills of Rights norte-americano. Do mesmo modo ele aduz que sendo o Direito Inglês mais voltado para as instituições e o Americano para o indivíduo, ambos se afastam do espírito revolucionário que se vê na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.

       Destarte, Jellinek atribui à distinção entre a Carta francesa e a americana a maneira em que um e outra considera o indivíduo. Aduz Jellinek: “Esta é a diferença mais importante entre a declaração americana e a declaração francesa: na América, as instituições positivas precederam ao reconhecimento solene dos direitos individuais; na França, seguiram-se a ele”. Jellinek concluiu a sua investigação confirmando que a base sobre as quais a Declaração francesa construiu a sua Carta repousa sobre a Declaração de direito de 1774, quando o congresso reunido em Filadélfia representando as doze colônias votou a Declaração de direitos “onde foi dito que os habitantes da América do Norte têm as prerrogativas que lhes pertencem em virtude do direito imutável da natureza, da Constituição inglesa e de suas próprias Constituições. De lá até a Declaração da Virgínia, somente ela existiu, e, portanto, há todo um abismo que separa esses dois documentos. A Declaração da Filadélfia é um protesto; a da Virgínia, uma lei”, donde Jellinek conclui que: “O que decorre de forma absoluta dessa pesquisa é que os princípios de 1789 não são outros senão os de 1774. Mas é incontestável, por outro lado, que sua influência duradoura na Europa está intimamente ligada à redação que receberam na França”.

 

A história política é, ainda hoje, muito mais uma história política da literatura e muito menos uma história das próprias instituições. O número de ideias novas, em matéria política, é bem mínimo. A maior parte delas parece já ser conhecida, ao menos no seu germe, pelas mais antigas doutrinas do direito público. Não ocorre o mesmo com as instituições, que estão em perpétua transformação e devem ser entendidas em sua particular evolução histórica.”

“A teoria do direito natural reconhece ao indivíduo, regra geral, um só direito natural: o direito de liberdade e o direito de propriedade.”

“Em todas essas Constituições, a declaração de direitos ocupa o primeiro lugar. Somente em segundo lugar vem juntar-se o plano ou quadro de governo. Fixa-se, então, o direito do criador do Estado, o indivíduo, gozando originariamente de uma liberdade ilimitada, e, em seguida, o direito que os indivíduos criaram: o direito do Estado”.

“Em realidade, as declarações de direitos nada fazem senão exprimir, em fórmulas gerais, uma organização jurídica de fato. Americanos proclamam como um “patrimônio eterno”, comum a todos os povos livres, os direitos que já possuíam. Os franceses, ao contrário, querem dar o que ainda não possuem, instituições que devem corresponder aos princípios gerais”. 

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CRIAÇÃO DO OCIDENTE

          Não é fácil descrever aquele que talvez tenha sido o mais importante historiador sobre a cultura da idade média e a religião cristã. Estamos falando do insigne historiador galês Christopher Dawson. A vasta obra de Dawson, a maior parte voltada para a história, é uma das mais precisas obras sobre a idade média. Dawson é um daqueles historiadores que tem uma capacidade especial de escrever sobre a história da idade média, a cultura e o cristianismo com uma notável erudição e ao mesmo tempo simples,  claro e cativante. Dawson foi um dos mais notáveis estudiosos da cultura europeia desde a sua origem nos primeiros anos iniciais do cristianismo, passando pela idade das trevas até a era do totalitarismo. Para Dawson a história europeia e a trajetória do cristianismo são indissociáveis quando se pretende compreender a origem do Ocidente. Este pensamento fica evidenciada em um dos seus mais importantes trabalhos sobre o surgimento do mundo ocidental. Em Criação do Ocidente, publicado entre 1947 a 1950 e inspirada em suas famosas palestras Gifford Lecture, Dawson mostra como a religião cristã foi fundamental na criação do Ocidente. Aqui Dawson desenhou o mapa da evolução cultural e religiosa da civilização medieval. Para Dawson sabemos demais sobre a religião do Ocidente e que o fato torna o trabalho de estudar a cultura e a religião do Ocidente uma tarefa árdua. 

        Diferente das demais religiões, o cristianismo tem riquíssimas fontes históricas em que o desafio não é estudar com poucas informações, mas fazê-lo em meio a uma quantidade imensa de informações esperando organização para ser uma fonte segura de estudo. Torna-se tão complexo o estudo do cristianismo quando se considera o fato que historiadores estudam a história com visão muito diferente da visão dos estudiosos do cristianismo, pois as visões que se tem da era cristã primitiva e da história medieval é de uma era de escuridão e ignorância em que a fé era o único instrumento disponível para manter contato com que se encontrava acima da compreensão humana. Entretanto, Dawson mostra que o homem não era escravo de si e que a liberdade estava no elemento espiritual. Esta liberdade espiritual, explica Dawson, exerceria sobre o homem uma imensa influência transformadora e criativa sobre a cultura social dos homens, durante sua trajetória histórica, assim como exerce influência igualmente transformadora sobre a vida pessoal de cada um”. Daí, conclui Dawson, que o estudo da cultura leva a crer que há uma relação íntima entre fé religiosa e realização social. O oriente se formou sobre a cultura medieval, escreve Dawson, e sobre as luzes fulgurantes da religião cristã. Ao contrário do que se aprende nas escolas, a idade média foi uma era iluminada pelas revoluções sociais e intelectuais. A Europa foi formada graças à determinação de inteiras comunidades cristãs e uma força criadora, que somente a fé é capaz de conceber, capaz de resistir ao barbarismo.

         A muito se atribui ao iluminismo o momento em que o homem perdeu o manto da superstição, deixando de lado a fé, e alcançando um lugar de observador e crítico da natureza, iluminando-se com o conhecimento de tudo que estava ao alcance da curiosidade e imaginação. Entretanto, historiadores modernos escreveram sobre investigações que mostravam que era medieval não se chama a idade das trevas por acaso. Aprendemos com eles e com os livros didáticos que no período que durou toda a idade média, o homem viveu na mais profunda ignorância. Aprendemos que não houve produção intelectual séria e que a ciência não teve nenhum impulso que colocasse a humanidade em direção ao progresso. Na Europa, isso era ainda mais profundo, posto que a civilização ocidental vivia quase que sob o domínio da Igreja Católica. Ora, nada mais distante da verdade na visão de Dawson, pois ele mostra que a idade média foi sim uma era de iluminação. A escolástica criou as condições para que a ciência e a razão florescessem, sem essas condições o iluminismo não teria existido. Dawson mostra que neste período dezenas de universidades se espalharam pela Europa. Que muitas bibliotecas guardam grandes clássicos sobre política, filosofia e história, bem como importantes trabalhos de Aristóteles foram transcritos para o latim. Para Dawson graças às universidades medievais é que a cultura ocidental florescerá. Para Dawson, não se pode chamar a idade média da era da ignorância um período que foi responsável pela fundação das mais importantes universidades do mundo como as universidades de Bolonha, Paris, Oxford. O que para alguns foi a idade média a era da escuridão, Dawson demonstra que a disciplina intelectual escolástica foi responsável pelo florescimento da razão, com destaque para os estudos de São Tomás de Aquino e a grande contribuição que o pensamento aristotélico trouxe para aquela era, bem como nasce neste período o interesse pelas investigações científicas que se expandiu muito com as universidades medievais que formariam homens empenhados em compreender os mistérios do mundo físico, mas sem esquecer de cuidar das coisas da fé, de maneira que Dawson acreditava que, “a história da Europa é a história de uma série de renascimentos de florescimento, espirituais e intelectuais, que emergiram de forma independente, geralmente sob fortes influências religiosas e que foram transmitidos por processos de livre comunicação. Durante o início do período medieval, foram as ordens monásticas o órgão central desse processo”. Por tudo isso, o autor afirma que o desenvolvimento social e filosófico da idade moderna colheu dos escolásticos as sementes que inspirariam as grandes criações do intelecto a qual deve a civilização ocidental todas as suas conquistas.

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O LIVRE MERCADO E SEUS INIMIGOS

   O Livre Mercado e seus Inimigos, livro escrito em 2017 por Ludwig von Mises, reúne nove palestras ministradas em 1985 por Mises sobre o livre mercado em meio às tentativas socialistas de desconstruí-lo. Mises faz as suas críticas sobre teorias marxistas apontando suas distorções e equívocos. Ele mostra porque o livre mercado é a única opção viável para a felicidade do indivíduo. Em contrapartida, ele descreve que o plano de economia socialista que trata a economia como ciência é uma das causas da fórmula desastrosa proposta pelos socialistas para a economia.  

   No capítulo A economia e seus inimigos, Mises argumenta que na história da economia as ideias de algumas pessoas foram nefastas para a vida em sociedade. No compreender de Mises, ao longo da história alguns indivíduos pouco ou nada contribuíram para fazer da economia uma ciência. Para Mises, personalidades como Jean Jacques Rousseau, Thomas Robert Malthus e até mesmo Adam Smith plantaram as ideias que germinaram nas teorias econômicas socialistas. Isto porque segundo Mises a percepção de economia em relação ao seu funcionamento na prática criava um imenso abismo entre a teoria e a realidade, uma vez que esses pensadores não acreditavam que a ação humana de trocas voluntárias ia além dos frios números estatísticos. Para Mises a competição levava à divisão do trabalho e ao desenvolvimento da cooperação voluntária entre os indivíduos. A descoberta de que a divisão do trabalho é mais produtiva do que o trabalho isolado foi um acidente fortuito que tornou possível a cooperação social, as instituições sociais e a civilização. Por conseguinte, o padrão de vida cresceu em todos os lugares como resultado da Revolução Industrial por conta da introdução da produção em massa.

   No capítulo Pseudociência e compreensão histórica Mises explica que os “economistas” do iluminismo, erravam ao tratar a economia como ciência exata. Para Mises a economia não pode ser tratada como uma ciência, pois não se pode prever o comportamento humano uma vez que a economia está diretamente relacionada com a ação humana. É quase que impossível estabelecer uma maneira que ajude a prever comportamentos humanos e assim fazer previsões econômicas exatas. Ele assegura que as ações humanas para prover às suas necessidades básicas não é como um experimento científico que pode ser medido ao longo de uma sequência de observação, outrossim, é reflexo da experiência que nascem das relações humanas, das experiências que surgem a partir das ações de trocas voluntárias diante das suas expectativas, desejos e necessidades para atingir seus objetivos. Mises acredita que “existem na natureza relações quantitativas constantes de pesos específicos que podem ser estabelecidos em laboratórios. No campo da ação humana, no entanto, especialmente no campo da economia, não há esse tipo de relação constante entre magnitudes. Assim, mantém-se opiniões contrárias e, mesmo hoje, muitas pessoas não conseguem ver que é impossível haver explicações quantitativas precisas no campo da economia“. 

   Em o O homem em Ação e a Economia Mises argumenta que a crença que professa que a economia não sabe lidar com o modo como os homens realmente vivem e agem é um grande equívoco. Isso em outras palavras é uma refutação direta à ideia rousseauniana de que o homem nasce bom e é corrompido pela sociedade, pois é natural que sendo o homem um animal social de acordo a concepção aristotélica, ele esteja munido de todas as ferramentas que precisa para viver em uma sociedade competitiva. Entretanto, Mises argumenta que ao retirar esse mal entendido surge o segundo mal entendido que é a presunção de que na economia as pessoas são motivadas apenas por uma ambição: “a de melhorar suas condições materiais e bem-estar“. Há ainda um terceiro mal-entendido sobre certos aspectos da ação humana: a crença de que a economia supõe que os homens  são razoáveis, racionais e motivados apenas pela razão. Mises mostra que esta é também uma ideia equivocada.

   Segundo Mises é na ação humana que reside o verdadeiro motor da economia. Ele sustenta isto a partir do seguinte princípio: “a única premissa da economia é que há condições no mundo em relação às quais o homem não é neutro e cuja situação ele deseja mudar através de ações propositais” assim, Mises  argumenta que “a ciência teórica da ação humana pressupõe apenas uma coisa: que há uma ação ou seja a luta consciente de indivíduos para remover a dificuldade e substituir um estado de coisas menos satisfatórios por um mais satisfatório” e que “a economia lida apenas com a ação e é tarefa da história descrever a diferença de objetivo“.

   Mises esclarece que nossas experiências estão diretamente ligadas ao que desejamos e esta determina o que queremos para resolver as necessidades. Mises diz que é neste contexto que a economia se aplica. Não somos racionais ao escolher comer, beber e vestir. Essas são atitudes que dizem respeito a muitas de nossas necessidades. Assim, Mises diz que: “a fonte dos fatos econômicos é a própria razão do homem ou seja o que chamamos na epistemologia que conhecimento a priori aquilo que alguém já sabe. O conhecimento a priori é distinto do conhecimento a posteriori aquilo que é derivado da experiência“. Mas ao mesmo tempo Mises afirma que “assim podemos eliminar esse antagonismo e aceitar o fato de que os ensinamentos da teoria econômica são derivados da razão“. A razão está na verdade relacionada com as escolhas que fazemos no sentido de que há um motivo para escolhermos. Veja o que Mises afirma: “as ações do homem no mercado, no governo, no trabalho, no lazer ao comprar e ao vender são todas guiadas pela razão criadas pela escolha entre que uma pessoa prefere em oposição ao que ela não prefere“, isto quer dizer que apesar das nossas  experiências determinarem muito do que desejamos, é  a razão que determina as nossas escolhas e as trocas que fazemos. Mas, Mises também explica que isso não significa que fazemos as nossas escolhas unicamente pelo ponto de vista racional, há muitos elementos emocionais e por isso o indivíduo se encontra em meios as incertezas na hora de escolher, consequentemente toda tentativa da economia planificada de prever o comportamento tende ao fracasso. No geral, Mises indica três condições necessárias para a troca de algo por dinheiro: “Quando as coisas são trocadas por dinheiro é possível usar termos monetários para cálculos econômicos mas apenas quando três condições são preenchidas: primeiro deve existir a propriedade privada não apenas de produtos, mas também dos meios de produção; segundo deve existir a divisão do trabalho e portanto a produção para as necessidades dos outros; terceiro deve existir uma troca indireta em termo de um denominador comum“.

   Já no capítulo Marxismo, socialismo e pseudociência Mises afirma que, “em geral, doutrinas filosóficas que dizem respeito a problemas históricos são doutrinas de um tipo muito especial. Elas têm que indicar não somente o que a história foi no passado mas presumir que sabem qual será o futuro reservado para humanidade e oferecer uma solução para problemas futuros“. Mas, Mises afirma que o problema do socialismo é que os seus defensores entendem que o “socialismo estava fadado a ocorrer, como resultado de uma lei da natureza“. Mises sustenta que, “a doutrina marxista era baseada no tão discutido materialismo histórico-dialético e econômicoou segundo Mises, o materialismo é uma das maneiras pelas quais as pessoas tentam resolver a relação entre as funções da alma ou da mente de um indivíduo de um lado e as funções do corpo do outro“. Para Mises o materialismo está equivocado quando desconsidera a divisão do trabalho, o maquinário e a relação existente entre eles. Diz que a doutrina  não entende que este é produto de ideias e que sem a divisão do trabalho, seja o maquinário seja o produto das ideias ou pensamento é inútil e a doutrina marxista em seus termos mostra-se um contrassenso. Mises, ao contrário do que dizia Karl Marx, sustenta que “as forças produtivas materiais são elas mesmas produtos das ideias“. Mises se opõe a teoria marxista de classe ao afirmar que “numa sociedade em que existe igualdade perante a lei na qual todos são livres para fazer o que quiserem não há classes rígidas e interesses irreconciliáveis de classes“. 

   Enfim, essa é mais uma obra dos clássicos de Mises, imperdível para quem precisa se aprofundar nas teorias da economia do livre mercado ensinado pela Escola Austríaca de Economia, do qual Mises foi um dos principais membros. Quanto mais se lê Mises maior é a certeza da aplicabilidade das suas teorias, ou seja, da economia livre para indivíduos livres. Mises nunca defendeu a ausência total de controle do Estado, ou seja, interferência zero em qualquer instância da sociedade. A sua luta foi árdua no sentido de se opor ao sistema de economia socialista em detrimento ao sistema capitalista. Não poderia ser diferente, visto que era um opositor terrível às ideias marxistas. Porém, ao estudá-lo, entendemos que a liberdade econômica é fundamental para o crescimento das pessoas, das nações e das sociedades. Mas isso não significa que o Estado não tem uma importância imensa na vida das pessoas, sobretudo em países pobres, onde a maioria da população carece dos recursos mais básicos e que, sozinhas, jamais vão sair das condições em que se encontram. Nós defendemos sempre o equilíbrio e o bom senso por entendermos que as necessidades básicas do indivíduo é a vontade de todos e que o Estado é o instrumento pelo qual o indivíduo garante os seus direitos e cumpre as suas obrigações.

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A LOUCURA DAS MASSAS

   Na visão do comentarista político Douglas Murray a sociedade, especificamente a massa que a compõe, parece ter perdido o sentido da realidade. De fato, ideologia de gênero, questões raciais e de identidades estão na base de todos os problemas da sociedade ocidental, particularmente nos EUA. Murray é um dos mais sagazes analista dessas três problemáticas do pós-modernismo. Em A Loucura das Massas Murray investiga como a sociedade norte-americana está se deteriorando por causa de questões identitárias e como isso está afetando a todos nós. Deveras, a pauta é extensa.

Desdobrando o feminismo, o racismo, o gayzismo e o transsexualismo, politizações ideológicas de inclinações libertárias posta à serviço do radicalismo militante, promovem discursos de verdades manipuladas, usadas contra aqueles que pensam diferente, oprimem e afirmam que são eles os oprimidos. Com efeito, eles promovem a intolerância contra quem eles acusam de intolerantes. Para Douglas Murray tudo isso tem um propósito que “desconhecido para algumas pessoas, deliberado para outras — é incluir uma nova metafísica em nossas sociedades; uma nova religião, se preferir“.

   Destarte, este é o grande objetivo da esquerda identitária: redesenhar a sociedade à luz das teorias marxistas criando novas ideologias que representam os anseios das minorias. Isso implica na reconstrução de todas as estruturas da sociedade, remodelando os seus valores, quando não destruindo-os, com o objetivo de recriar o próprio homem. Douglas explica que “a interpretação do mundo através das lentes da “justiça social”, da “política de identidade de grupo” e da “interseccionalidade” provavelmente é o mais audacioso e abrangente esforço, desde o fim da Guerra Fria, de criar uma nova ideologia” . De fato, as ações empreendidas neste sentido são claras e visíveis. Grandes órgãos internacionais como a ONU, a OMS, bem como ONGs e as empresas high-tech, com bilhões de dólares sendo direcionados para laboratórios de engenharias sociais, indústrias de engenharia bio-genética entre tantos outros investimentos em ações que fazem faz parte da agenda da Nova Ordem Mundial. A destruição da família tradicional, dos valores judaico-cristãos, tudo é parte de um plano da elite global para construir um mundo unificado em uma só cultura, uma só religião, uma só linguagem e um só pensamento que sedimenta as bases de uma entidade máxima chamada Estado Absoluto e Universal. 

   O pós-moderno está nos conduzindo à destruição espiritual e mergulhando num abismo de insegurança em todos os sentidos. Não se vê esperança para a humanidade a não ser um sentimento de vazio profundo que ocupa a mente e o espírito, sobretudo os jovens que mergulhados em temas autodestrutivos não lutam por valores pautados na realidade objetiva. Como diria José Ortega y Gasset, somos boias à deriva neste mar de ilusões em que se transformou  a vida moderna. Estamos sendo sufocados pelas ideias como política de identidade de grupo, justiça social, interseccionalidade e mais uma miríades de teorias pós-modernistas que na prática nos sufoca e só alcança o resultado oposto ao que se propõe combater que segundo Murray é  a trindade pelo qual o mundo atual é visto, interpretado.  Neste sentido Murray verifica que esses conceitos são destrutivos uma vez que não oferecem uma base sólida sobre as quais possamos dar credibilidade às identidades que deles brotam, e o resultado é, por exemplo, em relação a interseccionalidade “trata-se do convite para passarmos o resto da vida tentando identificar cada alegação de identidade e vulnerabilidade em nós mesmos e nos outros, e então nos organizarmos ao longo de qualquer sistema de justiça que possa emergir da perpetuamente mutável hierarquia que descobrirmos“.

    Estamos mergulhados num mar confuso de ressentimentos sem que de fato haja algum traço de verdade por trás disso. Até  porque a verdade é frequentemente relativizada a tal ponto de não ser possível saber de fato o que é estar certo ou errado, uma vez que tudo é  relativo. Sendo assim não há verdade única, segundo o pensamento dos pós-modernistas..  Douglas Murray esclarece que “um dos traços dos pensadores marxistas é que eles não hesitam ou se questionam em face da contradição, como poderia fazer qualquer um tentando chegar à verdade“. O problema é que na visão dessa gente a verdade não é um fim em si mesmo, mas um meio para se alcançar o objetivo. Ao sabor das circunstâncias a verdade mudará de acordo o objetivo a ser alcançado. Os fins justificam os meios. Douglas Murray explica que  para “o propósito de amplas parcelas da academia deixou de ser a exploração, a descoberta ou a disseminação da verdade. O propósito se tornou a criação, a promoção e a propaganda de um ramo particular e peculiar de política. O propósito não é a academia, mas o ativismo“. O caso das raças é notório pois “quando a questão da raça parecia finalmente superada”  explica Douglas Murray, “elas decidiram transformá-la mais uma vez na questão mais importante de todas“.

Está aqui evidenciado a distorção da realidade para alcançar um fim específico. Por conta, disso somos obrigados a conviver com coisa do tipo como apropriação cultural que impede que qualquer branco, por mais bem intencionado que esteja, de fazer uso de qualquer traço da cultura negra, ainda que seja para combater o próprio racismo ou ainda, a polêmica do banheiros frequentados por trans e a linguagem neutra. São comportamentos que refletem a loucura em que vivemos, a  loucura das massas.

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KEYNES X HAYEK

   Na economia moderna, especificamente a do século XX, dois nomes fizeram história por suas teorias econômicas. Mais que um debate entre duas grandes escolas economia (Escola de Chicago e a Escola Austríaco), John Maynard Keynes (1883-1946) e Friedrich August von Hayek (1899-1992) foram responsáveis por teorias econômicas que na prática causaram tantas transformações no desenvolvimento da economia no mundo. Afirmar de fato quem fez melhor para a economia é difícil, apontar quem venceu os debates, tão difícil quanto. Mas, certamente suas teorias estão imortalizadas nos anais das ciências econômicas, e de certa forma, o que o mundo alcançou em termos de desenvolvimento econômico deve-se a esses dois gigantes do pensamento econômico. Suas contribuições, neste sentido, foram imensuráveis. O jornalista americano Nicholas Wapshott, escreveu um interessante livro sobre esta contenda do século. Em sua obra Keynes x Hayek as ideias econômicas de ambos personagens são analisadas, mostrando os seus acertos e falhas. É um minucioso estudo sobre as teorias econômicas desses dois consagrados economistas, evidenciando não só as aplicações das suas teorias, como também descrevendo as diferenças e similaridades de caráter de dois homens de extrema inteligência e determinação. Na presente obra, o autor nos apresenta as origens e o legado deixado pelo maior duelo na história da economia. Superior até mesmo a outros debates protagonizados por Thomas Malthus (1766-1834) e David Ricardo (1772-1823) no século XVII.

   Ambos foram rivais, mas cada um ao seu modo e ao seu tempo inspirou jovens economistas de ambas correntes. Eles deixaram um imenso legado. Por um lado, estavam os keynesianos, aqueles que defendiam as ideias de John Maynard Keynes de que o governo deveria intervir sempre na economia, daí o intervencionismo. Por outro lado, os hayekianos, seguidores da doutrina econômica de Friedrich August von Hayek, adeptos da liberdade econômica, que acreditavam que o mercado tinha que ser totalmente livre para seguir seu curso através das trocas voluntárias e que ao fazer o bem a si próprio terá reflexo positivos na vida de todos uma vez que as pessoas precisam uma das outras, ou em outras palavras, a riqueza individual proporcionará bem-estar para a maioria, de uma maneira ou outra. Estas duas correntes de pensamento econômico vão, por mais de três décadas, ser responsáveis pelo sucesso e pelo fracasso da economia em todo o mundo. Por conseguinte, eles deixarão teorias econômicas que serão de grande valia para um mundo globalizado e em constante mudanças. 

   O autor mostra que foi o crash de 1929 que colocou o mundo à beira da ruína. Por outro lado, a tragédia econômica que atingiu profundamente a vida da maioria das pessoas no globo terrestre criou os meios e deu oportunidades para Keynes  e Hayek  apresentarem e testarem, na prática, suas ideias e teorias. “No novo terrível clima de desesperança e desespero, John Maynard Keynes , o otimista, estava apto para oferecer uma saída nova e clara do atoleiro, enquanto Friedrich August von Hayek , o pessimista, deveria construir um argumento para justificar por que todas as tentativas de arrumar o sistema eram inúteis”, explica o Nicholas Wapshott, autor do livro Keynes x Hayek, talvez dos mais importantes trabalho sobre o antagonismo nas ideias econômicas entre esses dois gigantes.  

   Claramente, Keynes acreditava que a solução para resolver a crise econômica de 1929 estava na intromissão do governo, que criando empregos como medidas para deter a inflação levaria ao controle da inflação e a consequente retomada do crescimento econômicos, medidas que oponentes chamavam de economia planificada e socialistas. Em contrapartida, Hayek acreditava que o momento do crash de 1929 era uma dificuldade normal e que, através de mecanismo naturais, a economia tende a se recuperar. Ambos acusavam a doutrina do outro como a única responsável pela catástrofe econômica que se instalou naquela época, reequilibrando as suas forças. É óbvio que tanto para os especialistas quanto para os leigos, as ideias de Keynes eram bem mais simpáticas do que as de Hayek, pois o assistencialismo é evidente e necessário, visto que as pessoas se encontravam falidas e precisando de suprimentos básicos para sobreviver. Por outro lado, a ideia de Hayek não ganhou a simpatia do povo americano porque deixava as pessoas entregues à própria sorte e ao sabor das variações da economia num momento em que estavam precisando de ajuda para viver dignamente, afinal, para aqueles que estavam preste a perder ou perdeu tudo e para quem estava desempregado não lhes parecia uma boa ideia esperar que o mercado econômico, por sua própria sorte, voltasse a prosperar. Sendo assim, as ideias para recuperação econômica de Keynes pareciam melhores, ou seja, esperar que o governo fizesse algo rápido para a recuperação da economia e injetáveis dinheiro nas empresas e nos bolsos das pessoas através de programas de auxílios. Esta ideia não só era simpática ao leigo, mas sobretudo aos governantes, que viam nesta situação uma oportunidade para suas agendas de poder. Assim os meios para a revolução keynesiana, nas palavras do autor, estão estabelecidos, jogando ceticismo sobre as teorias de Friedrich August von Hayek.

   Na prática, os sistemas econômicos propostos por cada um, alternaram-se no domínio da economia nos EUA e na Inglaterra, bem como no ocidente. Atuou muito fortemente nos Estados Unidos sendo um alicerce para o New Deal de Frank Delano Roosevelt. Deste , até o início do governo de Ronald Reagan, foram as teses de Keynes que imperaram na economia americana, isto independente das visões políticas dos democratas ou republicanos. Todos de alguma forma fizeram uso dos programas de John Maynard Keynes e mostraram por estes uma certa simpatia, explica o autor. Todavia, para alguns defensores do capitalismo Keynes apenas encontrou uma forma sorrateira de apoiar as ideias comunistas e que a curto prazo os custos de uma economia planificada se revelaria com hiperinflação.

   Durante 30 anos Keynes esteve à frente das maiores economias do mundo utilizando-se das suas teorias para tirar os EUA da recessão e depressão causadas pela guerra e pelo crash de 1929. Neste período que vai de 1946 a 1980, John Keynes foi admirado como a mente mais brilhante que ajudou o então presidente americano Roosevelt a tirar os EUA da mais séria crise econômica de todos os tempos. A partir daí, um excelente laboratório para testar as suas teorias e que se mostraram eficientes com bons resultados, alavancou a figura do Keynes como o americano mais importante do mundo a ponto de a sua doutrina econômica se transformar em ideologia, o keynesianismo. Por outro lado, a corrente de Hayek lutava para se firmar com as teorias com origem na Escola Austríaca de Economia e as suas próprias. Ao contrário do que ele esperava, as ideias de Keynes se mostraram eficientes e pareciam ter reequilibrado a economia. A diferença marcante entre as personalidades de cada um dos contendores, definirá qual doutrina se manterá em evidência por mais tempo. Com efeito, após muitos debates e muitas obras escritas, Hayek só conseguiu mostrar a força da sua teoria após a crise que se instalará no final dos anos 1980, quando pode mostrar ao mundo que as suas ideias eram melhores que as de Keynes e que as dificuldades que a economia dos Estados Unidos era fruto das medidas desastrosas do cidadão Keynes. Hayek se afasta no do sucesso de Keynes e só retorna ao palco a partir de 1963 e atinge o apogeu nos governos de Thatcher e Reagan, momento em que os conservadores mostravam para o mundo a face do socialismo e suas consequências, sobretudo para a economia. Foi o pior momento para Keynes. Mas foi Milton Friedman, o controverso pupilo de Hayek,  que de fato foi a mola propulsora para as ideias de Hayek. Este pregava o lema do seu mestre e afirmava que “seja qual for a análise econômica, é provável que a ditadura benevolente leve mais cedo ou mais tarde a uma sociedade totalitária” e neste sentido Friedrich Hayek acertará. O autor descreve que a batalha entre os dois blocos de ideias, que ele chama de economistas de água doce entre o de água salgada, período que dura de 1989 até 2008 com predominância de Friedrich Hayek consolidada pelos acontecimentos que abalaram o mundo como a queda do muro de Berlim e da URSS, sistematicamente encontradas nas advertências de Friedrich Hayek. Era o retorno e hegemonia do pensamento e atitude do livre mercado, cujo forte golpe, voltaria a ser desferido no seio do capitalismo em 2008.  Maynard Keynes não se considerava socialista, aliás ele alertou as autoridades no Tratado de Versalhes sobre as consequências da imposição de pesadas taxas cobradas aos perdedores da primeira guerra mundial. Hayek, por seu turno, era um antissocialista convicto. Esta oposição fica clara em suas famosas obras “O Caminho da Servidão” e “Os erros Fatais do Socialismo” em que Hayek faz ataques frontais ao sistema socialista, mostrando quanto ele tem de falácias. Inclusive ele fez duras críticas ao marxismo como se pode ver nos seus comentários revelados pelo autor: “como uma doutrina tão ilógica e obtusa podia ter exercido influência tão poderosa e prolongada sobre as mentes dos homens”. 

   Ainda assim, apesar do sucesso no período Reagan, Hayek, com o seu estilo pragmático e com suas teorias que defendia soluções para os problemas da economia, era muito difícil de encontrar eco entre uma boa parte dos políticos, principalmente entre os democratas, e dos empresários que confiavam no governo para assisti-los nos momentos difíceis, porque diferente de Keynes, Hayek entendia que a economia teria sempre o seu mecanismo próprio de regulação e que embora muitos pagassem um preço alto numa recessão econômica, com o tempo, está se recuperaria através dos seus próprios mecanismos. Por outro lado, Keynes, acreditava que a melhor forma de combater o desemprego na recessão era o governo atuando fortemente na criação de empregos através de grandes obras públicas. Foram estas teorias que por diversas vezes, grandes nações, atuando sob a orientação direta de Keynes, venceram a recessão proporcionando grande desenvolvimento econômico. Entretanto, o fracasso de John Maynard Keynes não estava na sua teoria, mas naquilo que Friedrich Hayek alertará, que foi o uso abusivo dos dispositivos recuperação econômica criados por John Maynard Keynes, este se encontrava na ambição dos governantes, pois o que era um remédio temporário para tirar o país da crise econômica, logo virou passaporte político. O próprio Keynes alertou para o uso abusivo do expediente, segundo Wapshott. Pragmático, Keynes acreditava que de uma forma ou de outra a solução dos problemas econômicos só podem ser resolvidos com uma visão macro e que somente uma economia com seus parâmetros voltados para o social teria a eficiência pretendida. Suas críticas eram claras à economia voltada para o indivíduo, portanto, uma oposição às ideias de Hayek. Ele assevera que “a experiência nos mostra que os indivíduos, quando constituem uma unidade social, são sempre menos perspicazes do que quando agem separadamente”. É com base nestes princípios que Keynes pensará a macroeconomia. Já Hayek pensava além das medidas dos cálculos econômicos socialistas e dizia que esta não explicava como a economia funcionava. Ele argumentava, mostra o autor, que “a chave verdadeira para compreender a atividade econômica, eram as escolhas que os indivíduos faziam, que eram tantas e tão diversificadas, que não podiam ser facilmente mensuradas. Este raciocínio brotou da inspiração em seu mestre Mises e faz parte dos fundamentos da Escola Austríaca. O autor explica que para Hayek “muito mais reveladoras, eram as miríades de preços diferentes acordadas em incontáveis transações individuais que, juntas, compõem a economia”. O autor exemplifica que não havia caminho fácil para sair de uma crise econômica e que para Hayek, a longo prazo, o livre mercado iria restaurar uma economia ao ponto onde todos estariam empregados. Uma pessoa desempregada, certamente, não concordaria com esta asserção. 

   A intervenção do Estado na economia nunca foi de fato uma boa ideia, pois sabemos o quanto a burocracia estatal é capaz de criar entraves para o desenvolvimento econômico. Por outro lado, a liberdade econômica representa também um grande risco quando esta se encontra navegando no vento livre do mercado. Hoje em tempos de bitcoin e com a globalização os riscos de crash mais profundos e devastadores que foram o de 1929 e de 2008 se mostram ameaçadoramente. O sistema financeiro não é mais local e sim global. De certo modo, sem a intervenção do governo para controlar os excessos, o livre mercado pode ser tão maléfico quanto o excesso de controle do governo. Keynes x Hayek leva-nos a reflexão sobre o legado deixado por estes dois pensadores da economia. É impossível imaginar uma nação economicamente viável num sistema invasivo como é no intervencionismo. Do mesmo modo, é inconcebível qualquer proposta de uma liberdade total do mercado econômica. O primeiro por ser uma trava ao desenvolvimento econômico pela burocracia, corrupção, falta de inovação e a dificuldade de empreender sob tantas regras e restrições. O segundo pelo fato de não haver nenhum mecanismo regulador, deixando ao livre-arbítrio econômico a decisão de que direção a economia deve tomar para resolver os seus próprios problemas. Neste sentido, talvez seja necessário uma nova saída, com ações que tragam não só segurança, mas a garantia de proteção da propriedade individual de um lado e o crescimento econômico com vista no social.

   Como um estudo biográfico destes dois gigantes, a obra acrescenta uma série de elementos que denotam bem a natureza de ambos, fontes de suas inspirações que de certa forma deram origens às suas teorias econômicas. Suas bibliografias expressam o vigor intelectual com que ambos se lançavam na defesa das suas ideias. Vale notar que o presente livro traz explicações simplificadas das teorias econômicas desenhadas pelos dois gigantes que auxiliam os leigos na introdução dos complexos mecanismos que põem a vigorosa engrenagem da máquina econômica para funcionar. O autor escreve que “ao levar o ataque intelectual ao laissez-faire, Maynard Keynes foi muito além das fronteiras da teoria econômica, que era ainda menos entendida popularmente do que é hoje, em relação às ideias de como assegurar que os indivíduos desfrutassem a máxima felicidade”. O autor explica que, “Maynard Keynes acreditava que era dever do governo fazer o que pudesse para tornar a vida mais fácil, particularmente para os desempregados” Isto evidencia o caráter de urgência com que Maynard Keynes pretendia resolver os problemas econômicos. Por outro lado, “Hayek acreditava ser inútil os governos interferirem com forças que eram, a seu modo, tão imutáveis quanto as forças naturais”.  O fato é que a despeito das agressões verbais protagonizadas por ambos os lados, ambos deixaram importantes lições para as novas gerações de economistas. Esta obra visa introduzir os leigos e os especialistas nos pensamentos econômicos destes dois gigantes. A sua leitura, entendo como essencial para compreender os fenômenos econômicos do século XXI e estabelecer um pensamento para ambos, nas próximas gerações. Neste debate não há vencedores, porém quem ganha é  a humanidade a partir do momento em que o conflito de ideias abre espaço para o nascimento de ideias convergentes, de maneira que tende-se mais para encontrar o modelo econômico ideal, justo para todos e sustentável.

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