O ESPÍRITO DO ATEÍSMO

 

O Espírito do Ateísmo, livro do filósofo francês André Comte-Sponville é a comunhão de um ateu com a vida religiosa. Quem já leu Pequeno Tratados das Grandes Virtude percebe que está dialogando com um ateu na busca de uma reconciliação com a verdade, diferente de como pensadores como Michel Onfray em seu Tratado de Ateologia que mostra uma posição radical às questões religiosas e a Deus. Em O Espírito do Ateísmo, André Comte-Sponville expõe de forma elegante a sua ética do homem ateu. Um ética com base na escolha do ateísmo como um caminho filosófico para a vida. Desta forma, ele procura expor o lado da filosofia ateísta em oposição ao esterótipo do ateu inimigo das virtudes.

“A fé é uma crença; a fidelidade, no sentido em que tomo a palavra, é mais um apego, um comprometimento, um reconhecimento. A fé tem por objetivo um ou mais deuses; a fidelidade, valores, uma história, uma comunidade. A primeira é do âmbito do imaginário ou da graça; a segunda, da memória e da vontade. Fé e fidelidade podem andar juntas, é claro: é o que chamo de piedade, para a qual tendem, legitimamente, os crentes.”

“Mas também pode se ter uma sem a outra. É o que distingue a impiedade (a ausência da fé) do niilismo (a ausência da fidelidade). Seria um equivoco confundir as duas coisas!. Quando não se tem mais fé, resta a fidelidade. Quando não se tem mais nem uma nem outra, resta apenas o nada e o pior.”

Neste sentido, para Sponville quando uma pessoa se torna ateia deve fazê-lo por exames e reflexões profundas e não por simpatias à ideias superficiais.

“Eu ficaria zangado comigo mesmo se levasse a perder a fé quem dela necessita ou, simplesmente, quem vive melhor graças a ela[…] Não faço proselitismo ateu[…] Há espíritos livres nos dois campos. É a eles que me dirijo. Deixo os outros, crentes ou ateus, às suas certezas.”

O próprio Sponville admite que ele está em busca de uma religiosidade. Se considerarmos que não há como o homem encontrar a religião, sem antes se encontrar com Deus ainda que o homem não tenha consciência deste contato, então de alguma forma Sponville já sente sobre si as inspirações universais.

“Como gostaríamos então de crer em Deus! Como invejamos, as vezes, os que creem nele! Reconheçamos: é esse o ponto forte das religiões, aqueles em que elas são praticamente imbatíveis[…]”

É este respeito que falta aos ateus e que encontramos em O Espírito do Ateísmo. Compreender que devemos respeitar as posições filosóficas e religiosas de todos.

Que se façam os debates, pois instrumento legítimo de exercício da percepção humana para a compreensão da vida, mas sempre na busca da verdade de forma elegante e respeitosa, pois às certezas pertencem apenas ao criador de tudo o que existe. Existimos em um universo inimaginável extenso.

Quando a nossa arrogância e vaidade nos revelam uma verdade, esta apenas apontas para muitas outras sobre as quais depositamos nossa total ignorância.

Vale aqui ressaltar a reflexão de Alain de Botton em seu livro Religião para Ateu

“[…] a real questão não é se Deus existe ou não, mas para onde levar a discussão ao se concluir que ele evidentemente não existe. A premissa deste livro é que deve ser possível manter-se como um ateu resoluto e, não obstante, esporadicamente considerar as religiões úteis, interessantes, reconfortantes – e ter uma curiosidade quanto às possibilidades de trazer algumas de suas ideias e práticas para o campo secular” e até explica porque criamos as religiões “[…]inventamos as religiões para servirem a duas necessidades centrais[…] que a sociedade secular não foi capaz de resolver por meio de nenhuma habilidade especial: primeiro, a necessidade de viver juntos em comunidades e em harmonia apesar dos nossos impulsos egoístas, e violentos profundamente enraizados. E, segundo, a necessidade de lidar com aterrorizante graus de dor, que surgem da nossa vulnerabilidade ao fracasso profissional, a relacionamentos problemáticos, à morte de entes querido e a nossa decadência e morte[…]”

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1 Comentário

  1. Fábio Moraes dos Santos

    Respondendo a Alain de Botton diria que a questão não é se Deus existe ou não, mas pra onde levar a discussão ao se concluir que ele evidentemente existe. É possível que os indivíduos e por consequência a sociedade construam um Mundo, onde o equilíbrio entre as partes que o compõem, tornem a fraternidade um fato concreto? E qual o papel das religiões nesse contexto? A religião só é verdadeiramente uma religião, se auxilia na constante e progressiva construção de indivíduos melhor preparados pra essa realidade, que por sua vez se torna o mote da existência.

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