Existe o homem medíocre, que nasce sem um objetivo. Diria, na verdade, que eles são a maioria. Vivem à deriva, num mar de ignorância. Incapazes de elevar-se acima das nuvens dos simplórios, se contentam com o vulgar, com aquilo que a biologia lhe determina e a necessidade obriga. Aceitam o fácil e fogem dos desafios que engrandecem os espíritos mais vigorosos. Vivem na invariabilidade porque não conseguem compreender as sutilezas da imaginação. Ortega y Gasset (1883-1955), autor de “A Rebelião das Massas”, os chamaria de boias à deriva, movendo-se ao sabor do vento. Eles são os homens medianos, sem um ideal como objetivos das suas vidas. Homens para os quais o ato de pensar está restrito aos sentimentos superficiais, limitam-se às instintivas necessidades do corpo. Há, entretanto, os que vivem por um ideal, que não se rendem aos obstáculos postos em seus caminhos. Estes são poucos é verdade, mas se destacam meio à multidão inerte. A breve passagem dos idealistas pelas massas é como balsamo para uma dor persistente. Os medíocres beneficiam-se com seus feitos.

Foi José Ingeniero quem melhor definiu o tipo medíocre. Na sua obra, “O Homem Medíocre”, com sutilezas e erudição ele redescobre o homem medíocre que desprovido da inteligência que o sublima, das nobres virtudes que o vigora, entrega-se ao servilismo dos seus próprios instintos e dedicam-se a uma vida sem um ideal. “No verdadeiro homem medíocre, a cabeça é um simples adorno”, escreveu José Ingeniero  esta conclusão que reflete como ele via a maioria dos homens da sua época. A partir desta obra, ele passou a trabalhar em temas positivistas, discorrer sobre idealismo, moralismo e ética, bem como estudar as idiossincrasias do homem medíocre. Desta forma, ele passa a se dedicar ao estudo e divulgação da sua filosofia sustentada por um forte idealismo. Assim, determinado na missão de salvar as futuras gerações de si próprio, escreveu o livro “O Homem medíocre” em 1913 e o dedicou aos jovens estudantes, pois acreditava que os jovens de hoje seriam os idealistas de amanhã. Ele sentia um desejo – mas que isso, uma certeza que algo de urgente precisava ser feito pela sociedade e que os jovens eram os meios para a realização desta fundamental missão.

José Ingeniero nasceu no ano de 1877, em Palermo na Itália, mas foi na Argentina que ele produziu a maioria das suas obras intelectuais. Ele foi um homem polivalente, de vasto repertório intelectual e dominava várias áreas de conhecimento como política, filosofia, psiquiatria, criminologia, medicina, ética, sociologia e história da literatura. Foi um dos fundadores do socialismo argentino, mas se decepcionou com a doutrina e por isto passou a discordar dela. Neste ínterim, simpatizou-se com os movimentos anarquistas e tornou-se um defensor e divulgador da doutrina positivista. Homem de espírito e inteligência elevadas, amante da liberdade de pensamento e dos ideais que glorificam o homem, por toda a sua vida viveu de acordo com o que acreditava. A sociedade em que havia ausência de homens idealistas era para ele o caminho certo para o retrocesso da civilização humana. Homem de pensamento visionário, Ingeniero argumentava que existia casta de homens cujos ideais os colocavam acima da maioria dos homens, bem como recaia sobre estes a salvação da espécie humana civilizada. Estes homens eram os idealistas. Ele afirmava que “os homem sem ideais fazem da arte um ofício, da ciência um comércio, da filosofia um instrumento, da virtude uma empresa, da caridade uma festa, do prazer um sensualismo”.

Com efeito, Ingeniero escreveu que homens sem ideais são incapazes de perceber e compreender o mundo que os rodeiam e por isso perambulam por ai valendo-se dos instintos, alimentando-se das migalhas daqueles poucos que, de fato, carregam o mundo na costa conforme escrevera Any Rand em sua obra “A Revolta de Atlas”. Por isto, José Ingeniero adverte que sem os instrumentos refinados para o idealismo, o medíocre tende a transformar sentimentos primitivos em ideologias. Ele sustenta que “reduzir o idealismo a um dogma de escola metafísica equivale a castrá-lo; chamar de idealismo as fantasias de mentes doentias e ignorantes que acreditam estar assim sublimando a sua capacidade de viver e de se ilustrar é uma das tantas leviandades estimuladas pelos espíritos superficiais”.

A mediocridade tem raízes profundas e diferentes nuances tal qual acreditava Ingeniero. Entretanto, mesmo com todo o vigor da sua obra, a mediocridade venceu e passou a fazer parte da natureza do homem contemporâneo. Portanto, devemos aqui estudar as palavras do mestre Ítalo-argentino. Seguir seu conselho, atualizando-o, como seria do seu gosto, e buscando a elevação do espírito desbravador que diante dos desafios rejubila-se e com prazer e com destemido ardor partir para mais uma jornada rumo aos confins do pensamento humano.


 

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