Às vezes é necessário se passar por certas situações da vida para que possamos ter uma ideia das dificuldades que circunscrevem a história de quem se encontra em situação de extrema dificuldade. É o caso das vítimas do campo de concentração nazista. Quantos relatos, quantos depoimentos foram colhidos de suas vítimas que resultaram em milhares de páginas escritas sobre o holocausto? Porém, quem sobreviveu ao holocausto e consegue narrar as atrocidades tem a nauseante função do narrador vivo do fato que vivenciou. Enquanto, porém, quando o narrador não só descreve os fatos da realidade visual e sensível tem-se então a verdadeira visão do que realmente foi viver num campo de concentração. O Dr. Victor Frankl teve o dissabor de ser esse narrador vivo de um campo de concentração. Lá  ele aprendeu que foi a busca por sentidos que fez com que muitos conseguissem sobreviver a uma existência de martírios. O Dr. Victor Frankl, criador da Logoterapia, cuja base da sua ciência extraiu das suas experiências no campo de concentração, descreve em seu livro Em Busca de Sentido, como ele aprendeu sobre a natureza humana sendo ele próprio vítima do nazismo. O livro contém importantes lições sobre o sentido da vida que quando analisado à luz do seu outro livro, O Sofrimento de uma Vida sem Sentido, dá  ao leitor uma razão para entender os seus problemas pessoais e encontrar nele motivos para enfrentá-los.

A terrível experiência do autor deu origem a sua logoterapia extraída dos campos de concentração nazistas. Num campo de concentração, explica Victor Frankl, vêm uma série de questões existenciais: qual o propósito de tanto sofrimento? Como encontrar sentido quando a vida não vale nada?  Por outro lado, questionamos também como o ser humano é capaz de infligir tanto sofrimento a outrem, muitas vezes em ato de puro sadismo e crueldade. Não é incomum, diante de tal situação se perguntar, onde está Deus que não pune os malvados e acaba com o sofrimento das vítimas. Mas, será esse um problema de Deus ou seria ele tipicamente humano? Claro, ninguém iria querer estar no lugar do autor ou de qualquer vítima do holocausto para compreender ou tentar entender os porquês do sofrimento.

A alma dobra sob o peso da crueldade. Pessoas destruídas por fora e por dentro para as quais nada mais importa vagam moribundas. Apenas vivem o hoje esperando o desfecho do próximo segundo da sua vida miserável sem ter a quem recorrer. Em tais condições o condenado regride a condições de total insensibilidade. O sofrimento alheio já não lhe causa mais indignação. Perdeu-se toda a capacidade de sentir, reagir, indignar-se. Do outro lado, os algozes. Travestidos das suas ideologias e o falso sentimento de superioridade, pretende salvar o homem, purificando-o sobre o seu próprio sangue. 

Em Busca de Sentido mostra como o desprezo pela vida humana alimentado por ódios incompreensíveis e desprendido de qualquer humanidade leva às vítimas, diante de sofrimento físicos e morais inimagináveis, a um estado de total escravidão psicológica. À medida que o espírito enfraquece e o corpo se submete a vontade dos seus algozes diante da face da dor excruciante, da humilhação e vergonha, quebrantado pelo sofrimento, pessoas antes de espíritos fortes transformam-se em objeto do sadismo dos seus carrascos, incapazes de reagirem submetem-se aos caprichos do mal. Evidentemente que os carrascos estão apenas obedecendo ordens, dirão alguns. Todavia a maldade só germina em solo fértil.

Nenhuma palavra no livro se refere a ideologias políticas, muito menos é uma denúncia sobre o totalitarismo. Na obra, o autor descreve tão-somente pessoas e a sua relação com o sofrimento e a busca por sentidos. Desta análise, o autor extrai duas reflexões: como é possível que o ser humano possa causar e suportar tanto sofrimento? Qual o sentido de tratar o outro como o mais repugnante dos vermes? Em Busca de Sentido é uma reflexão sobre o que esperamos das vida e a do outro ao fazermos as escolhas erradas. Como um profissional que estuda o comportamento humano, Victor Frankl transformou a sua dor em uma ciência para ajudar as pessoas a encontrarem a resposta para o sentido da vida.

A pessoa, aos poucos, vai morrendo interiormente. Fora as diversas reações emotivas acima descritas, o prisioneiro recém-internado ainda experimenta, durante o primeiro período de sua estada no campo, outras sensações extremamente torturantes, que logo tenta suprimir. Surge, sobretudo, indizível a saudade de seus familiares. Uma saudade tão ardente, que só resta uma sensação: a de se consumir. Além disso, há o nojo. O nojo de toda a fealdade que o cerca, interior e exterior“. p35

 

“Compreende-se perfeitamente que, naquela situação psicológica sem saída e sob a pressão da necessidade de se concentrar na preservação imediata da vida, toda a vida psíquica parece baixar a um nível primitivo. Por isso, colegas de orientação psicanalítica entre os companheiros costumavam falar de uma “regressão” da pessoa no campo de concentração, de um retraimento a uma forma mais primitiva da vida psíquica“. p44

 

“Na maioria dos prisioneiros, a preponderância dos instintos primitivos e a peremptória necessidade de se concentrar sobre a pura e simples preservação da vida constantemente ameaçada suscitam uma depreciação radical de tudo aquilo que não serve a esse interesse exclusivo. Assim se explica a ausência absoluta de sentimentos por parte do prisioneiro quando avalia os acontecimentos“. p49

 

“Precisamos aprender e também ensinar às pessoas em desespero que a rigor nunca e jamais importa o que nós ainda temos a esperar da vida, mas sim exclusivamente o que a vida espera de nós“. p101

 

“Em última análise, viver não significa outra coisa se não arcar com a responsabilidade de responder – adequadamente às perguntas da vida, pelo cumprimento das tarefas colocadas pela vida a cada indivíduo, pelo cumprimento da exigência do momento”. p102

 

“Quando um homem descobre que seu destino lhe reservou um sofrimento, tem que ver nesse sofrimento também uma tarefa sua, única e original. Mesmo diante do sofrimento, a pessoa precisa conquistar a consciência de que ela é única e exclusiva em todo o cosmo dentro deste destino sofrido. Ninguém pode assumir dela o destino, e ninguém pode substituir a pessoa no sofrimento”. p102

 

“Somente aos poucos se consegue levar essas pessoas a reencontrar a verdade, tão trivial, de que ninguém tem o direito de praticar injustiça, nem mesmo aquele que sofreu injustiça. Precisamos trabalhar no sentido de levar essas pessoas ao reencontro dessa verdade, pois a inversão da mesma facilmente poderia trazer consequências piores do que a perda de alguns milhares de grãos de aveia para um agricultor desconhecido”. p117

 

“A logoterapia, ou, como tem sido chamada por alguns autores, a “Terceira Escola Vienense de Psicoterapia”, concentra-se no sentido da existência humana, bem como na busca da pessoa por esse sentido Para a logoterapia, a busca de sentido na vida da pessoa é a principal força motivadora no ser humano Por essa razão costumo falar de uma vontade de sentido“. p124