Em sua obra A Ética da Liberdade, Murray N. Rothbard, expõe mais que conceitos sobre liberdade econômica. Nesta obra, ele desenvolve um sistema de pensamentos filosóficos e políticos que mostram como a liberdade é fator essencial para a verdadeira felicidade do indivíduo. Do mesmo modo, ele constrói argumentos que derrubam as doutrinas socialistas coletivistas, bem como a ação feroz do Estado sobre a propriedade individual. No âmbito econômico ou fora dele, Murray Rothbard, demonstra que as suas ideias são mais radicais que as de Mises, levando os princípios da liberdade econômica muito além das ideias da Escola Austríaca.

Na primeira parte, Rothbard procura refutar ideias das correntes keynesianas, entre outras escolas econômicas, de que teorias racionalistas e fórmulas matemáticas são suficientes para compreender o mecanismo de troca voluntária entre as pessoas e a sua relação com a vida de cada um em um sistema econômico dinâmico. Rothbard, recusa esta tese e defende que a razão não é capaz de responder às peculiaridades da natureza humana numa relação social de indivíduos com necessidades específicas, desejos e sonhos. Assim como Mises, Rothbard acreditava que o indivíduo é  motivado por complexos mecanismos de necessidades físicas e psicológicas e que qualquer teoria para prever o comportamento deste fracassaria.

Na primeira parte desta obra, que versa sobre a Lei Natural, Murray Rothbard procura explicar como surgem os fatos que impulsionam o homem a decidir sobre uma escala de valores. Murray Rothbard se contrapõe à noção de que a natureza do homem não está aberta à investigação racional.  Murray Rothbard argumenta que a lei natural seria para o homem uma espécie de “ciência da felicidade”.

Para Rothbard “o grande defeito da teoria da lei natural é ter sido profundamente estatista em lugar de individualista”. Para Rothbard este é um erro que vem desde Platão e Aristóteles, cenário que segundo autor, ganha nova configuração a partir das análises de John Locke que teria transformado a lei natural clássica em “uma teoria baseada no individualismo metodológico e por isso, político”. Ele assevera que “a partir da ênfase de Locke no indivíduo como agente de ação, como a entidade que pensa, sente, escolhe e age, originou-se sua concepção de lei natural da política que estabelece os direitos naturais de cada indivíduo”. e conclui: “É sobre esta tradição de libertarianismo de direitos naturais que o presente livro tenta se estruturar” e vai além ao afirmar que o Tratado sobre o Governo de Locke “foi certamente uma das primeiras elaborações sistemáticas da teoria de direitos naturais libertária individualista”. Partindo desse pressuposto para Rothbard o maior valor do indivíduo é a liberdade em todos os seus aspectos e sobre este raciocínio, ele tenta elaborar um sistema de ideias que não só descreve o processo ideal de uma economia de livre mercado, mas doutrina que reconheça que a liberdade do indivíduo deve ser considerada com muito mais amplitude.

Na segunda parte, Uma Teoria de Liberdade, Rothbard examina a liberdade de maneira ampla e profunda, analisando diversos segmentos da relação do indivíduo com a sociedade. Aqui ele procura estabelecer um nexo causal entre o desejo do indivíduo ser totalmente livre e a concordância que este desejo encontra com as ideais de uma sociedade libertária propostas por Rothbard. 

Rothbard introduz nesta parte do estudo algumas reflexões sobre a liberdade do indivíduo à luz da teoria da economia clássica conhecida como Economia de Crusoé, inspirada no clássico da literatura mundial Robinson Crusoé (1719) de Daniel Defoe. O modelo Robinson Crusoé foi utilizado pelos economistas clássicos para examinar de maneira simplificada a interpretação da relação entre as necessidades do indivíduo e as variáveis que modificam de forma imprevisível o comportamento desta relação num universo em que só exista um indivíduo. Desta forma, a história de Robinson Crusoé oferece as condições ideais para a construção de modelos matemáticos capazes explicar e prever os diversos fenômenos econômicos.

Embora crítico desse modelo, Rothbard acredita que “a abstração da análise de algumas pessoas interagindo em uma ilha”, aqui ele se refere ao personagem Sexta-feira, “nos permite uma percepção precisa das verdades das relações interpessoais, verdades que permanecem desconhecidas se insistimos em examinar primeiro o mundo contemporâneo todo de uma vez e como se fosse uma coisa só”. Segundo Rothbard, a análise formal da ação humana, ou seja, a praxeologia,  encontra corolário na economia de Crusoé e, portanto, é de grande ajuda para “solucionar alguns problemas da filosofia política como a natureza e o papel da liberdade, da propriedade e da violência”, argumenta Rothbard.

A primeira ideia que vem a cabeça a partir da interpretação da teoria da sociedade libertária proposta por Rothbard é que o indivíduo nesta condição acabaria não tendo liberdade alguma, dado que  decorreria daí uma lei natural derivada da força, ou seja, o mais forte tiraria a liberdade do mais fraco. Rothbard contrapõe esta ideia ao sustentar que “alguns críticos acusaram esta liberdade de ser ilusória porque o homem é limitado pelas leis naturais. Isto, no entanto, é uma distorção –  um dos muitos exemplos da persistente confusão moderna entre liberdade e poder”. Mas, o poder vem da ausência de lei que limite o poder do mais forte. Neste sentido, não há uma liberdade total, mas regulada pelo direito do mais fraco. Entretanto, pode haver liberdade total do indivíduo onde há lei? Se não houver lei, teria o indivíduo liberdade total sobre todos os seus atos? Estamos falando de uma liberdade ampla e pelo visto é esta a ideia proposta por Rothbard. Uma sociedade em que o indivíduo tem a total liberdade. Porém como evitar que a liberdade de um seja a prisão de outro. Rothbard sugere que a liberdade não tem relação com o poder quando escreveu nesta obra: “Resumindo, seu poder é necessariamente limitado pelas leis naturais, mas não sua liberdade de vontade, seu livre arbítrio”.

     Como um autêntico libertário Rothbard acredita na liberdade total do indivíduo em todos os espaços públicos. Esse indivíduo livre, sem barreiras que o impeça de agir de acordo a sua vontade e a sua necessidade, deve em algum momento conflitar com os direitos dos outros. Mas Rothbard não parece se preocupar muito com isso. Pelo contrário, ele acredita numa espécie de ordem natural em que o indivíduo se imporá limites pelo bem da própria sobrevivência em grupo.  Mas uma vez, isso me parece um pouco distante da realidade.  É da natureza humana ocupar o maior espaço possível. Isto significa que o seu arbítrio será a bússola do seu comportamento cuja agulha sempre apontará para a direção que lhe pareça favorável. No meu entendimento, Rothbard acerta quando defende o mínimo de intromissão do estado na vida do indivíduo (na verdade Rothbard acreditava que o Estado era uma abstração desnecessária),  por exemplo, mas creio que erra ao defender a liberdade absoluta. Até que ponto o indivíduo deve ser totalmente livre isso é questionável.

Essa obra pequena e fantástica é leitura obrigatória para os espíritos livres e embora haja pontos controversos em sua obra, vale a pena estudá-la. Eis algumas ideias sensacionais extraídas do livro A Ética da Liberdade.

 

Se o livre arbítrio de um homem em adotar ideias e valores é inalienável, a mesma condição afortunada não é compartilhada por sua liberdade de ação – sua liberdade de colocar estas ideias em prática no mundo.

 

A economia revelou uma grande verdade sobre a Lei natural da interação humana: que não só a produção é essencial à prosperidade e a sobrevivência do homem como também a troca o é.

 

Este ganho para os dois homens só é possível devido a dois fatos primordiais da natureza – leis naturais – nos quais toda a teoria Econômica é baseada: (a) a grande variedade de habilidade e de interesses peculiares a cada pessoa; e (b) a variedade de recursos naturais na diferentes áreas geográficas. Se todas as pessoas fossem igualmente habilidosas e igualmente interessadas em todos os assuntos e, se todas as áreas do planeta fossem homogêneas, não haveria espaço para as trocas.

 

Esta revelação das vantagens da troca, descoberta por David Ricardo, em sua Lei da Vantagem Comparativa, significa que, em um livre mercado de trocas voluntárias, o “forte” não devora ou esmaga o “fraco”, ao contrário que diz a suposição comum sobre a natureza da economia de livre mercado. Muito pelo contrário, é precisamente no livre mercado que o “fraco” tira proveito das vantagens da produtividade porque é benéfico para o “forte” trocar com eles.

 

O regime de liberdade genuína – a sociedade libertária – pode ser descrito como uma sociedade onde nenhum título de propriedade é distribuída, onde, em resumo, nenhuma propriedade do homem sobre sua pessoa sobre bens tangíveis é molestada, violada ou prejudicada por qualquer outro homem. Mas isso significa que a liberdade absoluta, no sentido social, pode ser disputada não apenas por um Crusoé isolado, mas todo homem em qualquer sociedade, não importa quão complexa ou desenvolvida.