Em abril de 1986, na cidade Salvador, um grupo de homens armados são protagonistas de uma tentativa frustrada de assalto ao Banco do Brasil. Este episódio ficou conhecido como “o assalto dos cuecas”, pois os cincos assaltantes, uma vez presos, posaram de cuecas para foto. Mais, a cômica tragédia não ficou só nisso. O pior que isso foi a justificativa dada para o assalto: primeiro os assaltantes afirmaram que eram membros do PT, comprometendo, segundo o autor, a imagem do PT e, em seguida, que o objetivo era fazer fundos para ajudar a Nicarágua, algo que a Polícia Federal sob o comando de Romeu Tuma não se convenceu. Na realidade a história era um pouco diferente da que contaram os autores do assalto: tratava-se de um esquema orquestrado pelo PCBR, um partido que vivia na clandestinidade, para angariar fundos para manter as finanças do partido. O autor sustenta que o Partido Comunista Brasileiro Revolucionário foi criado anterior ao PT e deste foi também um dos idealizadores e que, portanto, sugeria uma ligação entre ambos neste episódio.

É sobre esta trágica face da esquerda que o historiador Lucas Porto Marchesini Torres apresenta em sua dissertação de mestrado e que mais tarde transformar-se-ia no livro Estratégias de uma esquerda armada. Nesta obra, Lucas Porto revela toda a trama e história deste que para alguns foi o último assalto da esquerda armada no Brasil. Assim, neste livro, fruto de uma extensa pesquisa, serão revelados todos os aspectos da militância, dos assaltos e as finanças do PCBR na década de 1980, época em que o Brasil estava, segundo o autor, se redemocratizando.

Lucas Porto assevera que “este livro pretende examinar as estratégias controversas do PCBR durante a década de 1980 a partir de suas ações armadas vinculada ao marxismo-leninismo em plena conjuntura da redemocratização”, e desta forma é uma tentativa de, conforme sustenta o autor, “contornar os vícios de um episódio lembrado e contado como folclore ou anátema na história do Partido dos Trabalhadores. Para Lucas Porto o assalto de Salvador foi considerado “uma provocação forjada contra o Partido dos Trabalhadores tamanho os riscos que ele ameaçou levar ao partido”. É uma obra importante na medida que revela as estratégias das esquerdas armadas e sobretudo, a vida dos terroristas a partir de uma ótica acadêmica sem partidarismo. Neste quesito o autor foi cuidadoso o suficiente em manter-se, na medida do possível, neutro em suas acepções.

Anteriormente, o grupo já havia praticado outros dois assaltos na Bahia com relativo sucesso, mas o do Banco do Brasil é o que melhor representa as crises internas dos movimentos e partidos cujo idealismo era uma persistente tentativa de dar vida a um sistema que já há muito demonstrava sinais de fraqueza, que logo se revelaria mais tarde com a queda dos impérios socialistas. Os maiores expoentes do PCBR e autores do assalto, Prestes de Paula, sustentava toda a sua militância nas doutrinas marxista-leninista e com forte influência do pensamento de Paulo Freire.

A ideia por trás das ações de uns poucos grupos terroristas no início da década de 1980, anteriores à anistia e quando o país se encontrava no processo de redemocratização, revela o quanto havia de destoante entre as doutrinas do PT e do PCBR. A influência de Lenin conduzia alguns partidos a acreditarem na luta armada, ainda, como único meio fortalecer o partido e a causa. Uma ideologia que já dava sinais de anacronismo. O PT por outro lado acreditava num estilo mais gramasciano em que a estratégia era dominar a política e a economia através da inserção paulatina nas instituições públicas, educacionais etc.

Para o PT estava claro, somente pelo voto a esquerda poderia tomar o poder. Para a ideologia do PCBR, isto não fazia sentido conforme depoimento de um dos integrantes do assalto, o Marcos Reale, ao explicar a forma que os jovens eram recrutados.

“Eu era doido para ser chamado. O ativismo, a vontade de participar, de militar. E ele observavam o jeito de quem pregava a luta armada mesmo, a derrubada do regime através das armas e não através do voto, que com voto não se derruba regime nenhum”


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