Christopher Dawson (1889-1970) foi para muitos a grande voz na história do cristianismo no século XX. Influenciado por Oswald Spengler, T. S. Eliot e Arnold J. Tonybee produziu várias obras voltadas para o exame da religião, da política e da economia na sociedade moderna. Mas, foram os estudos dogmáticos e historicistas sobre a religião católica, antes um crítico desta, que o tornou conhecido. “Progresso e Religião“, é a síntese do pensamento dawsoniano em que, como Oswald Spengler, previu o afundamento da civilização ocidental.

Progresso e Religião é composto por duas partes. Na primeira, Christopher Dawson examina a ideia de progresso, sobre os diversos aspectos que o compõe na construção da sociedade. Compara a antropologia com a teoria do progresso e investiga as religiões do mundo, bem como a relação destas com o elemento espiritual nas diversas culturas.

Para Christopher Dawson, a crença no progresso que perpassava as mentes de teóricos políticos revolucionários de um futuro sonhado, nascido sob a luz do iluminismo no século XVIII e XIX, chega aos nossos tempos como uma nova civilização urbana e mecânica.

“Em pleno sentido a doutrina de Progresso precisa englobar a crença de que todos os dias e de todas as formas o mundo fica melhor e melhor. Apesar disso, os seguidores mais entusiastas dessa teoria têm sido exatamente aquelas pessoas mais impacientes com relação à injustiça e à irracionalidade das instituições sociais existentes. E uma vez que o estado corrente do mundo é resultado de um processo que existe desde épocas muito remotas, pareceria que a cadência do progresso e tão lenta que só conseguiremos atingir um estágio de perfeição final em um futuro infinitamente distante.”

Neste sentido, em Progresso e Religião, Christopher Dawson resgata as idéias positivistas de Auguste Comte que, para o autor, identifica as tendências entre a ciência e a sociologia, e aponta para o progresso como uma alternativa não apenas científica, mas sobretudo humana, e por isso social.

 “Além do mais, uma vez que a síntese científica, resultado da filosofia positiva, era essencialmente sociológica, seguia-se que a natureza deveria ser interpretada em termos de sociedade e não ser considerada, como o todo maior do qual a sociedade forma uma parte dependente. Aos olhos de Comte, a função da ciência era limitada estritamente pelo serviço à humanidade e condena a busca do conhecimento por si só.”

Este racionalismo científico ignora a história como o fundamento principal da concepção de uma sociedade. Em Progresso e Religião, para a ideia de progresso, a história era um entrave para um futuro da humanidade racional e metódica. Mas, as intricadas relações entre o passado e o futuro gerou a diferenças entre preservar a cultura e apagá-la da história de um povo. Neste contexto Christopher Dawson rejeita Oswald Spengler, o autor de A Decadência do Ocidente.

“Portanto, fica claro que, para explicar a vida das civilizações, não é suficiente possuir uma fórmula para o ciclo de vida de povos individuais, temos também que compreender as leis da interação cultural e as causas da ascensão e da queda dos grandes sincretismos culturais, que parecem eclipsar os destinos de povos individuais. Considerado sob esse ponto de vista, o último estágio de uma cultura, a fase a que Spengler confina o nome de “civilizações”, adquire importância peculiar. Não se trata meramente de um período negativo de putrefação e de morte, como ele a descreve, é o momento em que a civilização está mais aberta à influência externa.”

No sentido antropológico, não há cultura sem história. Ambas são guardiãs das nossas heranças e tradições. Como assevera Christopher Dawson.

“Dessa forma, para julgar a permanência e a força de uma cultura, temos que considerar não apenas o caráter de suas instituições ou a qualidade de suas realizações intelectuais, mas, antes de mais nada, sua vitalidade interior. A força de uma instituição política ou social, como a de um estilo artístico, depende não de sua racionalidade abstrata ou de sua beleza, mas de sua comunhão com a cultura viva. A imitação mais fácil de um trabalho antigo de arte não pode trazer de volta à vida um estilo de arte desaparecido uma vez que a tradição viva tenha sido interrompida.”

Na segunda parte de Progresso e Religião, Christopher Dawson investiga os alicerces das principais religiões do mundo, sobretudo as cristãs, judaica e islâmica. Examina as ideias por trás dos pensamentos que formaram o século XV até a idade moderna, passando por vários períodos da história como na era clássica grega e romana, à escolástica, continuando pelo renascimento e a era das revoluções e industrialização, até chegar a era das grandes guerras. Christopher Dawson retrata todos esses momentos que espelham a gloria e a derrota da história humana em que naufraga o homem diante do seu desejo de ser a própria imagem de Deus.

“A religião foi concebida como um complexo de ideias e de especulações concernentes àquilo que não é passível de ser conhecido, portanto, pertencia a um mundo diferente daquele que era a província da sociologia.”

As três religiões monoteístas fundaram as bases metafísicas da divindade humana perpetradas por aqueles que buscavam a razão sob a fé. Com isso, criou-se a possibilidade do homem buscar a transcendência através da autoconsciência do “penso logo existo”. Esta percepção lhe confere uma autoridade até então atribuída aos deuses. As religiões começam a estremecer diante da reformulação do pensamento ocidental. Dawson escreveu:

“Pode parecer que a Europa estivesse destinada a se tornar uma igreja-estado teocrático, na forma do islã, com o papa como o comandante dos fiéis. E, de fato, houve um perigo real de que, como a Igreja linha êxito, em dominar o Estado, ela passaria a ser secularizada pelo crescimento da riqueza e do poder político até tornar-se uma organização mais legal do que espiritual.”

“A grande síntese intelectual do século Xll é freqüentemente considerada como o triunfo do dogmatismo teológico, mas na verdade ela foi a afirmação dos direitos da razão humana e fundação da ciência européia.”

“O predomínio das influências orientais havia conduzido a uma concentração no lado espiritual da natureza do homem. Seu ideal era o de passar além das coisas sensíveis e tornar-se unido ao divino e ao inteligível pelo poder da inteligência. Foi o trabalho de uma nova filosofia, representada acima de tudo por Santo Tomás, que pela primeira vez rompeu com a velha tradição e traz de volta o homem a ordem da natureza.”

A secularização inicia um novo momento na história da humanidade, explica Christopher Dawson. As religiões não estão mais no centro do poder. O conhecimento científico toma o seu lugar no destino das nações, mas ao mesmo tempo começa outro movimento em busca do poder das massas, pois o poder dos homens que governavam era conferido por Deus e apenas para estes. Era necessário fazer revoluções na forma do idealismo social conforme descreve Christopher Dawson.

“Além do mais, o movimento do racionalismo filosófico foi apenas um lado do desenvolvimento francês do século XVlll. Não menos importante foi o idealismo social de Rousseau, que foi muito mais pronunciadamente religioso em espírito. Rousseau era, ao mesmo tempo, revolucionário e reacionário do tipo de Tolstói.”

“Essa é a fonte real do movimento revolucionário no continente. A revolução social e política tornaram-se uma característica tão comum da vida moderna européia que tendemos a nos esquecer dos quão raros tais movimentos são na história. Eles ocorrem somente quando uma cultura está passando por um processo de transformação interna. Revolução social é um índice de mudança espiritual.”

A ideia de progresso veio acompanhada de grandes mudanças sociais, políticas e econômicas com grande impacto para o cristianismo, o mais afetado. Isto fez crescer o gnosticismo e o ateísmo: fenômenos que ajudaram gerar a nova religião civil ou a religião secular, instrumento essencial de uma Nova Ordem Mundial. Entretanto, Christopher Dawson lembra, há um movimento circular e que Deus não está morto.

“A ideia de Progresso perdeu sua conotação racional e utilitária e tornou-se simplesmente o aspecto humano do movimento eterno de retorno pelo qual o mundo criado é levado de volta a Deus.”

e sustenta que a Europa deve buscar do retorno à religião e a Deus, a sua sobrevivência.

“A secularização de uma sociedade envolve a desvitalização daquela sociedade, pois, como Péguy disse o desaparecimento de uma religião não é sinal de progresso, mas indício de decadência social.”