O livro Contra a Propriedade Intelectual do advogado e escritor americano N. Stephan Kinsella (1965) versa sobre a investigação da propriedade intelectual à luz da visão libertária. Este é um tema bastante difícil e causador de muitas controvérsias, dado que até onde se sabe, os Tribunais de Justiça estão abarrotados de processos a respeito, cujo objeto remete aos direitos de propriedade conferidos àqueles que entendem que não pode o outro deste se apoderar sem a sua legal autorização. Neste esclarecedor opúsculo Kinsella busca esclarecer que PI (propriedade Intelectual) não deve seguir as mesmas premissas que os objetos tangíveis, onde se prevê os direitos autorais contra a usurpação através do plágio entre outros expedientes, uma vez que não são recursos escassos, pois intangíveis. Propõem assim uma reflexão jurídica conceitual para desdobramento lógico desta questão.

Segundo o portal jurídico JusBrasil, o advogado Carlos Eduardo Vanin esclarece no referido portal, ao tratar a conceituação da PI, que “a Propriedade Intelectual engloba o campo de Propriedade Industrial, os Direitos Autorais e outros Direitos sobre bens imateriais de vários gêneros, tais como os Direitos Conexos, e as Proteções Sui Generis”. Do ponto de vista libertário, conforme a abrangência explicitada por Vanin, a questão tende a se complicar, visto que os libertários raciocinam sobre elementos que impõem limites aos direitos da propriedade intelectual quanto aos direitos autorais da produção intelectual.

Com efeito, sob forte influência da Escola Austríaca de Economia, Kinsella defende que a PI na forma de patente não pode ser justificada. Na realidade, como um bom libertário, Kinsella acredita que não é possível qualquer tipo de restrição à produção intelectual. Ele acredita que “aqueles mais preocupados com a liberdade, com a verdade e com os direitos, não deveriam tomar como dado o uso institucionalizado da força para aplicar direitos sobre PI”. Neste sentido, Kinsella espera que haja outros meios não institucionais e não coercivos que permitam que a produção intelectual (textos, artigos, obras literárias, músicas, produções artísticas e, naturalmente, sobre o próprio corpo) esteja à disposição para quem interessar com o mínimo de restrição de acesso e publicidade.

Para Kinsella, o primado dos direitos individuais sobre os recursos escassos (ele coloca a PI como um recurso escasso) deve ser considerado e aplicados. Para chegar a esta conclusão, Kinsella examina a PI à luz do direito da propriedade sob os seguintes o aspecto da propriedade e escassez: os libertários acreditam em direito de propriedade sobre bens tangíveis e, portanto não invalida o critério de apropriação. Contudo, Kinsella explica que bens tangíveis (recursos) são escassos, pela sua natureza, está sujeito aos direitos de propriedade. Neste contexto, ele assegura que “a função dos direitos de propriedade é prevenir conflito interpessoal quanto aos recursos escassos, ao alocar posse exclusiva de recursos a indivíduos específicos (donos)”. Kinsella alerta que os objetos e ideias da PI, por não serem escassos como um objeto tangível, ele pode ser produzido infinitamente. Donde decorre a inadmissibilidade da propriedade intelectual de objetos e ideias, ou seja, do intangível.

Ora, com estes argumentos Kinsella assevera que a “ideia” é um produto que pode se enquadrar como algo que pode ser escasso? Neste sentido, Kinsella afirma que não, pois o que se deve considerar, conforme ele postula, é que não há conflito quanto ao seu uso. O que certamente ocorreria com objetos tangíveis. Ele argumenta que “se você copiar um livro que eu escrevi, eu ainda possuo o livro original”, isto porque segundo ele ainda se possui o padrão de palavras que constitui o livro. Ele enfatiza: “a propriedade intelectual não pode ser consumida”, portanto, sustenta que “apenas recursos escassos, tangíveis, são objetos passíveis de conflito interpessoal, então é apenas a eles que as regras de propriedade são aplicáveis”.

Entretanto, o problema não se resolve de maneira tão simples quanto parece. Existem produções que são intelectuais cuja posse da criação é dada ao primeiro que teve acesso, o criador. Esta afirmação conduz uma análise mais cuidadosa. Kinsella argumenta o seguinte sobre o reconhecimento dos direitos de propriedade da PI: “o problema é que se direitos de propriedade são reconhecidos sobre recursos não escassos, isso necessariamente significa que direitos de propriedade sobre recursos tangíveis são correspondentemente diminuídos”.  Isto porque, conforme esclarece Kinsella, “a única forma de reconhecer direitos ideais em nosso mundo real, escasso, é alocar direitos sobre bens tangíveis”. Desta maneira, Kinsella, afirma que os direitos de propriedade de todos os objetos tangíveis seriam seriamente afetados.

De certa forma Kinsella critica a forma de controle de propriedade como uma espécie de posse intelectual que o dono da ideia seria beneficiado por todos aqueles que dela fizesse uso por todas as gerações. Ao que parece, já é notório que nos direitos autorais da produção musical, esta questão encontra respaldo. 

Finalmente, o livro chama para uma reflexão sobre o problema de quem produz, exclusivamente, a partir do intelecto, cujo resultado é o intangível e que espera um reconhecimento compensatório pelo seu esforço, bem como a manutenção da posse de sua propriedade. Enfim, as questões aqui extraídas do livro Contra a Propriedade Intelectual longe de esgotar o debate, provoca-o.